Escute na página de ÁUDIOS a declamação! Vá lá ouvir.
Valdir Rangel
Um dia
Numa sala de cirurgia
Agonizava em estado doentil
Um poeta
Escutava o que falavam
O doutor e a equipe médica
Naquela grande tensão
Desejavam fazer um transplante
De coração, naquele poeta
O poeta sem forças
Esmorecido fez um aceno
Lento
e balançando o dedo indicador
Fez o seu apelo e desejo
E com as últimas forças que restavam-lhe e lhe faziam ainda vivo
Disse baixinho, ainda isso
Doutor eu não quero,
De transplante eu não preciso
Não tire o meu coração
É como tirassem o meu grande motivo,
Só ele é quem me entende
Nas horas que eu mais preciso
É semente com ele, que me inspiro!
Ele me acompanha nas saudades
No papo íntimo comigo
No amor que tenho doado
E na tristeza e felicidade,
que eu tenho na vida sentido
Deixe o meu coração no meu peito
Ele será sempre o meu melhor amigo
Nas madrugadas nas luas
Nos bares nas ruas
Nas agruras e alegrias
Nos sonhos utópicos que sonho
Todos os dias
E nos versos que eu faço
Que alguém batizou de poesia
Deixe o meu coração em paz
Ele é meu, faz parte de mim
Não posso arrancá-lo do peito
E deixá-lo sofrendo morto por aí
Eu e ele somos carne e unha
Ele com a inspiração
Eu com a minha alma nua
Com os sofrimentos da vida
Procurando a verdade crua
E ele docemente, me acolhe tão inocente
Me tratando como um carente
E me presenteando,
com uma paz tão terna e pura
Ouvindo o pedido, o último desejo
Do agonizante poeta
O cardiologista reuniu a equipe
Médica
Trancou o CTI, e foi passear
Diante do mar,
Foi olhar o brilho das estrelas
Tomar um pouco de ar
e sentiu com emoção
A solidão e a beleza dos versos
do poeta, no coração dele tocar..
E visualizou a subida dos mais lindos versos,
Que seguiam ao céu, na direção da linda lua, que estava também a chorar...