A sinceridade, em tese, é uma virtude. Porém, há um quê de rudeza quando se é franco ao extremo. Assim, valer-se de mentiras, que parece em si uma atitude danosa, às vezes é preferível a sair desferindo verdades a torto e a direito. Por exemplo, parece inegável que quase todo recém-nascido chegue ao mundo com cara de joelho, mas ninguém seria cruel a ponto de dizer isso a uma mãe amamentando seu rebento pela primeira vez – ou, talvez em tempo nenhum. Comanda a prudência que se diga, sempre, que tal criança é linda e, se as circunstâncias permitirem, que é a cara do pai. Depois disso, ao longo da vida, cada um terá de enfrentar suas verdades da melhor forma possível. Este mundo é cheio de eufemismos hipócritas que, além de rechear as relações com falsidades, por vezes, indisfarçáveis, dificulta sobremaneira a que cada um aprenda a fazer um juízo crítico sincero a respeito de si mesmo. Muitos predicados negativos são encobertos com os providenciais desvios de palavras que contornam os dissabores de fatos imutáveis. Assim, o gordo passa a ser meramente “forte”; e o feio jamais ultrapassa o limite de ser apenas “simpático”; e o parvo se conforta com a idéia de ser não mais do que “simples”. A necessidade de boa convivência com o próximo quase que nos obriga a aderir a esse festival de hipocrisias. Contudo, há de se convir que nem sempre se pode ostentar a manifestação da verdade como algo louvável. A verdade, nada mais que a verdade, acaba sendo, não raramente, um dilema a ser enfrentado – quando não, um impasse de difícil solução. O que fazer diante daquilo que é tosco e bizarro nos outros? Calar-se parece uma boa solução, porém quem se omite, às vezes, colabora para que o ridículo se perpetue sem chance de evolução. Mentir descaradamente é algo que leva a angariar simpatias, mas pode vir a insuflar os que se iludem facilmente a alçarem voos que os levarão a tombos com consequências irreparáveis. Declarar com franqueza todo e qualquer fato que se constate, por virtuoso que possa parecer, pode se transformar em agressão gratuita e sem proveito. Resta, portanto, a cada um de nós inspirar-se com algum bom senso para saber como dosar a sinceridade, de forma a distribuí-la como um ato de justiça e não como a aplicação de uma pena sem propósito. De qualquer forma, não se perca jamais pelos elogios e, também, nunca se deixe levar em demasia pelas censuras. Os outros, assim como você e eu, em face de seus próprios julgamentos, também estão sujeitos a tropeçar, de vez em quando.