Ah se não fossem os outros!
É bem difundida a emenda que Cristo fez aos dez mandamentos, ao preconizar: “Ama o próximo como a ti mesmo.” Parece postura das mais difíceis de ser plenamente assumida, por mais sublime que eventualmente possa ser um espírito humano.
Interessante relembrar que, num polo diametralmente oposto, Sartre tenha sugerido que “o inferno são os outros”. Ou seja, esta infestação de “próximos” à nossa volta é que tornaria nossa vida um verdadeiro turbilhão de choro e ranger de dentes.
Já, no meio termo, encontramos Dostoiévski que anunciava: “Quanto mais gosto da humanidade em geral, menos aprecio as pessoas em particular, como indivíduos.”
Como estamos, aqui, filosofando sem compromisso, não se pode esquecer de Aristóteles que registrou que “o homem por natureza é um animal político”, isto é, que tende inexoravelmente a arregimentar-se em grupos sociais organizados – ou, quase isso.
O diagnóstico da situação é simples, porém a questão posta é complexa. É destino inarredável do ser humano ter sua vida interligada a outros de sua espécie. Porém, os homens entre si, apesar de sua inevitável interdependência, disputam espaços na ânsia de superarem-se ou de dominar uns aos outros, digladiando-se por supremacias em embates que se espalham desde as mais comezinhas relações sociais até o ponto de que haja povos que pretendem a exterminação de outros povos.
Como lidar com isso? Ai, quem me dera ter a resposta!
O que é certo é que a cooperação, a solidariedade e o respeito mútuos é que devem pautar basicamente nossa postura com relação aos outros à nossa volta. Se houvesse uma ampla reciprocidade, a paz certamente se instauraria em qualquer circunstância. Contudo, não se pode jamais abandonar a defesa da liberdade, individual ou coletiva, evitando que sejamos, a qualquer pretexto, subjugados por quem eventualmente nos rodeie.
A vida realmente pode tornar-se um inferno, se ficarmos por aí choramingando: “Oh, olha o que os outros fizeram comigo!” Contudo, a melhor reação é reafirmar: “Oh, olha o que eu fiz com o que os outros fizeram comigo!” Se houver um mínimo de bom senso, tal postura deve preservar cada um de nós como indivíduos sem gerar uma reação em cadeia que contamine o meio de mágoas e rancor.
Quanto aos outros? Ah se não fossem os outros! Que seria de nós?!