* O que um carinho faz *

Publicado por: Sunny L (Sonia Landrith)
Data: 18/12/2007

Créditos

Texto : "O que um carinho faz" Crônica e voz de Sunny Lóra Gravado em 18 dez 2007 Software de edição : Audacity Trilha sonora : Classical Archives
O que um carinho faz...
® Sunny Lóra


E lá fui eu pra mais uma tarde com amigos que precisam muito de mim... Toda vez que eu entro nessa de querer afagar as pessoas sinto uma mistura de medo e de emoção. Coloquei meu jaleco cor-de-rosa e subi a rampa. A enfermaria E tem de tudo um pouco. Pessoas que sentem dor, que sorriem ante situação que não queriam estar... Visitei a Victoria, uma senhora morena e bonita que estava pronta para ir para casa às cinco – era apenas uma hora da tarde e ela estava com a bolsa pronta, cabelos penteados e arrumadinha : feliz. Ainda ia ter que esperar mais um pouco, mas só a sensação que hoje vai dormir na cama dela... ah, bom demais...

Falei com o italiano de olhos azuis, cheio de esperança de ir embora também.

- Mas sabe, Sonia, se eu tiver que ficar aqui mais uns oito dias tá bom demais, contanto que eu saia andando!

A minha companheira de trabalho ainda não havia chegado e eu, timidamente, entrei na enfermaria 8, onde um homem alto, de calça creme e uma camisa de seda verde esbravejava com todos. A pobre da esposa não falava nada, só olhava para ele. Eu cheguei devagar e ensaiei “um alô, como vai?”

- Vou nada! Quero mais é ir embora daqui! Estou com fome, desde as 8 da manhã e ninguém nem olha pra mim! Esse pessoal tá pensando o que ? Que eu vou ficar aqui à disposição até que aconteça um milagre e alguém venha me buscar para a cirurgia? Vou nada! Vou é embora... e pra que essa minha mulher fica aqui? Ela pode ir pra casa! Não quero ninguém comigo não!

Eu não tive medo ... peguei nas pequenas mãos e o conduzi com carinho até a cama, ainda intacta. Comecei a concordar com tudo que ele dizia... e lembrei, de repente, que a esposa podia estar sem almoço... ops! Acertei na mosca! Ensinei-lhe onde é a lanchonete e me comprometi a ficar com o zangadão do marido, que de voz não tinha nada, apenas “gritava” baixinho, no tom que o som de sua garganta lhe permitia.

Um sorriso ficou presente em mim o tempo todo. Comecei pedindo-lhe que deitasse que eu ia levantar a cabeceira da cama para que a gente pudesse conversar. Para minha surpresa, ele mesmo se prontificou a me ajudar!

- Sabe, Sonia, eu sou aposentado há 13 anos. Tenho carro, casa, quatro filhos e cinco netos. Adoro a minha vidinha jogando cartas com os amigos da pracinha. E agora esta voz resolveu me deixar... mas você vai ver, eu vou ficar bom e da próxima vez que você vier aqui você não vai me achar...

Fiquei ouvindo o homem de cabelos brancos, olhos verdes combinando com a camisa... segurando em sua mão e olhando para ele como se fosse a pessoa mais importante do mundo – para mim, naquele momento, ele era mesmo!

Nem sentiu que uma hora e meia havia se passado quando o pessoal da cirurgia veio buscá-lo... e da maca, cheio de coragem, acenou-me com um beijinho de vento, enviado por suas mãos. 


Obs. Meu amigo nos deixou dois meses depois.


Ilustração : net
Sunny L (Sonia Landrith)
Enviado por Sunny L (Sonia Landrith) em 08/05/2007
Reeditado em 25/06/2008
Código do texto: T479814