Vizinhos...
Costumo achar que os melhores anos de nossas vidas acontecem entre a infância e a adolescência. Minha pequena cidade, no interior do estado, traz-me infinitas e boas lembranças. O cheiro do fogão à lenha com o feijão ainda está impregnado e é tão bom... A nossa casa simples, de assoalho de madeira, extremamente limpo e branco de tanto passar palha de aço, tudo isso é motivo para grandes recordações. No fundo da casa, mamãe tinha uma pequena horta – sou fascinada por ervas aromáticas – onde plantava coentro, salsinha, cebola verde, couve, alface, milho verde e fruta-pão. Ninguém poderia dizer que passávamos dificuldade, mesmo sendo muito pobres: a troca de hortaliças e frutas era algo que os vizinhos sempre faziam... a cumplicidade na ajuda mútua.
Eu, um tico de gente, era a mensageira das trocas: com uma pequena caneca de alumínio, mamãe mandava um pé de alface pra Dona Iria e a espoletinha trazia de volta um pouco de pó de café para tomar com a fruta-pão – a “escadinha” em penca de cinco irmãos, feliz, agradecia! Aos sábados à tarde, quando chegava a hora de matar a galinha, mamãe nos mandava pra casa dos vizinhos. Mamãe não suportava que sentíssemos pena do pobre animal. Quando havia a execução sumária dos porcos os vizinhos se reuniam e a Soninha corria léguas da casa – só voltava quando tinha certeza que o pobre coitado já estava virando lingüiça.
Um dia ganhamos um novo casal de vizinhos. Eu me escondia atrás da cerca de nossa casa e ficava imaginando como seria a casa da nova vizinha ... e mais, queria muito pegar o bebê no colo. Enquanto os dias passavam, mamãe e papai começaram uma amizade com o casal, que dura exatos 60 anos. Eu segurava na saia dela enquanto as duas trocavam alfaces e cebolinhas. Aproveitei uma dessas idas e entrei na pequena casa. Ainda sinto o cheiro das toalhas engomadas. Segurei o bebê no colo, escondida de todos. Quase que o danadinho me derrubou no chão – o bercinho era muito alto pra mim. Senti um carinho que sei que duraria pra sempre.
Minha tia Olívia era outra que adorava nos presentear com caquis e bananas. Sempre que eu atravessava a rua para visitá-la, voltava para casa com alguma coisa gostosa. Até hoje todos riem muito quando se lembram do dia em que a tia Olívia mandou uma dúzia de bananas-ouro para minha mãe, através de mim.
Só foi encontrar as cascas, bem amassadinhas, debaixo da escada, alguns dias depois.