Vivia reclamando que não tinha. Em se tratando de desperdício, de todos falava mal: um dia, da vizinha: “por jogar comida fora.”; num outro, do vizinho: “Não sabe economizar.”; dia desses, dos colegas: “todos uns folgados!”, da gente em geral: “Êta povo mimado! Tudo têm demais! Nada sabem valorizar... Se um pouco mais eu tivesse, que diferença faria!” Por certo. Seguiu os dias assim, sempre a reclamar da falta. E era de amor, ou de dinheiro, paciência, ou de educação; de tolerância, ou de respeito; de afeto e consideração. Muita falta de vergonha na cara, de fato, falta de tudo, de tudo o que se possa imaginar, até da própria imaginação. Um dia, entretanto, seu tempo veio. Daí não teve mais do que reclamar. Vivia reclamando que não tinha, e se vendo com tanto, em demasia, começou a desperdiçar. E eu me pergunto: o que será que lhe faltava?
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