Há uma cena no filme “Um lugar chamado Notting Hill” em que os protagonistas principais, Anna e William, interpretados por Julia Roberts e Hugh Grant, contemplando uma gravura com a reprodução de um quadro de Marc Chagall – La Mariée – desenvolvem o seguinte diálogo: – Você gosta de Chagall? – pergunta William.
– Sim. – responde Anna – Se parece com como estar amando deve ser. Flutuando em um céu azul escuro.
– Com um bode tocando violino... – emenda William, fazendo graça com um dos detalhes surrealistas da tela.
– Sim. – retruca novamente Anna – Felicidade não é felicidade sem um bode que toca violino! Na verdade não é a única referência ao surrealismo que existe naquele filme. Em pelo menos outras duas cenas, cada um dos dois enamorados também qualifica sua inusitada e aparentemente impossível relação como sendo algo surreal. Pois bem! Isto aqui não é uma resenha ou crítica cinematográfica. O tal do filme é uma comédia romântica que caiu no gosto popular com tamanho sucesso que é reprisado ao menos umas quatrocentas e oitenta e oito vezes ao ano, em diversos canais na tevê a cabo – e algumas mais, na tevê aberta. O que importa é que toda relação amorosa é surreal para quem a vive. Todas elas têm algo de inusitado, de impossível e de onírico sob o ponto de vista dos amantes, que se sentem flutuando em céu azul. A perplexidade alheia, como não consegue absorver o que há de belo e surreal entre duas pessoas que se gostam – por inadequado que isso possa parecer – desvia sua própria incompreensão anotando e destacando o que há de bizarro. Ou seja, só para quem está de fora e de longe é que ressaltam, sempre, os bodes tocando violino. Infeliz de quem liga para o que os outros pensam!