Onde mora a esperança?

 

Onde mora a esperança?



Sou paulistano e amo São Paulo. Contudo, tenho enorme simpatia e atração pelo Rio de Janeiro. Apesar de minhas origens, confesso que meu espírito irreverente fica muito mais à vontade em paragens cariocas. Portanto, jamais fui afetado por crises de bairrismo, até porque, penso eu, essas cidades continuam sendo os principais polos econômicos e culturais deste nosso Brasil sem eira nem beira. Ao invés de viverem acirrando disputas sem sentido, melhor fariam se irmanando em projetos de interesse comum a ambas.

Se encontrasse opções vantajosas de ocupação profissional, até me mudaria para o Rio sem pensar muito. Não se imagine que isso é algo fora da realidade porque, no início deste terceiro milênio, por pouco não me radiquei em Porto Alegre; outra cidade pela qual me apaixonei. Porém, as coisas nem sempre andam no sentido que a gente quer e, provavelmente, da mesma forma que vi as esquinas gaúchas ficarem longe de meus planos, não vislumbro melhor sorte para o sonho de despertar todos os dias olhando o Cristo Redentor.

Nada disso, com certeza, interessa a mais ninguém. Mas é bom que se saiba que minha paixão por São Paulo não exclui o respeito e a admiração por outros cantos do Brasil. E digo tudo isso, na verdade, para espelhar minha isenção com relação a qualquer ânimo bairrista. Pois bem! Dito isto, vamos ao que, em tese, talvez interesse.

Lamento profundamente que o Brasil vá sediar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos na próxima década. Tanto se me dá onde a seleção brasileira de futebol vá fazer o jogo inaugural do certame promovido pela FIFA e, caso chegue à final, também pouco me importa qual a praça onde irá buscar mais um título. Da mesma forma, não me empolga nem um pouco que medalhas olímpicas sejam entregues a atletas brasileiros em solo tupiniquim. Tanto num caso como no outro, o Hino Nacional soa bem em qualquer lugar.

O que me deixa absolutamente indignado é que bilhões e bilhões de dólares – ou reais, como queiram! – serão empregados na promoção de eventos esportivos que, por mais benefícios que possam trazer ao Brasil e aos brasileiros, nem de longe poderiam ser considerados como prioridades numa terra onde tudo falta à população.

É irrelevante por qual estimativa de investimentos queira-se pautar – e elas são várias, umas maiores que outras e, ao que tudo indica, o céu é o limite. Em qualquer circunstância esse volume descomunal de recursos melhor estaria se investido em outras áreas que poderiam, de fato, interessar à nação brasileira.

Alguém já disse – não lembro quem – que população é quem vive num país, povo é quem nasce num país e, enfim, nação, é o conjunto dos que foram, dos que são e dos que serão desse país. Portanto, buscar o bem da nação é algo que tem o sentido de agregar algum benefício imediato e que, também, se perenize em prol das gerações vindouras. Não basta ressaltar o orgulho patriótico daqueles que aqui nascem e, menos ainda, é pouco querer enaltecer as vantagens passageiras que irão favorecer aqueles que, por ora, aqui vivem.

As dezenas e dezenas de bilhões – seja lá de que moeda for – que serão empregados na promoção dessas competições, seriam suficientes, por exemplo, para reformar e ampliar totalmente o sistema judiciário deste Brasil, tornando os processos mais céleres e a distribuição da justiça mais eficaz, quiçá espalmando de vez essa certeza de impunidade que por aqui grassa por todos os lados. Ou, quem sabe, implantando políticas e medidas mais consequentes em prol da saúde e do saneamento básico da população, reduzindo em breve tempo a mortalidade e estendendo a longo prazo a expectativa de vida dos brasileiros. Nem seria necessário falar o que isso poderia trazer de benefícios se empregado na educação de nossos jovens, que serão os legatários desta terra.

Enfim, o tempo vai passando, a idade vem chegando e a vida para mim, certamente, não perdurará por muito mais que duas décadas; um pouco mais, um pouco menos. Não vejo, contudo, nenhum lugar para onde eu possa me mudar neste Brasil onde resida, também, a esperança de um país mais justo.

Só me resta cobrir-me de verde e amarelo e esperar que as competições se iniciem. Vou torcer fervorosamente por nosso sucesso. Não concordo com as festanças que fazem com o dinheiro público, mas não pretendo perder as festas do esporte. Uma parte do pouco pão e do muito circo que se distribui por aqui, também me cabe!
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