Não sou o único ser a habitar este intragável universo, mas às vezes sinto como se somente a mim fora dada a sentença de sorvê-lo em grossos goles, enquanto meus irmãos e irmãs de destino não o são também de desdita e passam por esta enfastiosa existência vivendo em arco-íris, sendo que, para mim, miserável criatura, as portas do paraíso são veladamente guardadas por vilões os quais jamais hei de vencer. Subsistem animados em meu cerne, dentro de mim, dormindo ao lado de meu coração.
Infelizmente não me igualo ao comum. Infelizmente fujo dos inestimáveis padrões. Infelizmente não ouso renegar a minha essência por segundos fugazes de prazer em um mundo corrompido. Infelizmente eu sou forte o suficiente para aceitar que talvez eu seja o único, mas, não o bastante para me acostumar com isso.
Eles não me vêem. Passam por mim todos os dias, às vezes deixam cair suas máscaras, mas não conseguem tocar-me suas palavras vãs. Eles não me vêem. Tentam me rotular, como sempre o fazem, mas sequer conseguem ler em meus olhos toda a minha tristeza por sua superficialidade.
Recuso-me a ser mais um protótipo do perfeito ou um rascunho adorável de algo belo. Recuso-me que minha carcaça jovem e aprazível seja de mim o todo que exista, ou o bastante, e que não me basta. Recuso-me a crer que seja esta a minha sentença por ter cometido crime algum além do de ter nascido neste tempo sem sua lassidão e leviandade.
Sim, deveras sou invisível. E não hei de lamentar minha sorte, pois que mais infeliz sorte do que a daqueles que são incapazes de enxergar e habitam comigo a mesma escuridão? E é ainda pior, eles não o sabem.