Nós; meu filho e eu!
Meu primogênito veio me visitar. Feliz da vida, festejei porque ele concluiu o ensino fundamental e ele, por outro lado, comentou sobre a festa de formatura que ocorreria aquela noite e, todo “pimpão” - eita termo velho! – falou-me de seu traje; que, enfim, iria sair por aí desfilando de terno. No ensejo, aproveitou para me pedir que eu lhe ensinasse a dar o nó na gravata. Sem pestanejar pedi-lhe que me desse a gravata que eu deixaria o nó já feito para uso.
Inconformado ele insistiu que queria aprender a dar o nó ele mesmo e não que eu fizesse isso em seu lugar. Por herança genética desta linhagem à qual pertenço, ele padece daquela presunção natural de que tudo pode aprender e fazer com a maior facilidade do mundo. Em regra, entre os “de Faria”, isso é verdade, contudo, chamei a atenção para que, no caso, é preciso não só aprender a dar o nó na gravata como, ainda, adquirir uma certa prática antes que o resultado final seja suficientemente aceitável para ser exibido por aí pendurado no pescoço.
Não teve jeito! Até sei a quem esse garoto puxou! Bateu o pé até que eu lhe desse as instruções necessárias. E, assim, pus-me a demonstrar na prática como a coisa se dá: “passe por aqui, torça ali, puxe acolá...” Tudo isso, obviamente, enquanto eu fazia movimentos mecânicos, adquiridos ao longo de décadas.
Algumas tentativas meu filho fez, contudo, em vão. Nada de o tal nó sair como deveria. Mostrei-lhe umas outras tantas vezes, bem como, fizemos juntos, um mirando o outro. Nada disso funcionou! Enfim, quando ele, minimamente, achou que já dava para se virar sozinho, resolveu treinar na estatueta que tenho decorando minha sala de estar. Pena que a estatueta não vá a festas, porque, por pouco, tivemos de decidir se cortávamos a gravata ou quebrávamos a peça, já que ele conseguiu enforcar a coitada de forma quase definitiva.
Como o tempo clamava por uma solução, ele acabou se dando por vencido e aceitou que eu deixasse sua gravata com o nó já preparado. De qualquer maneira, lançou um dramático vaticínio jurando que, em breve, daria nós em gravatas custasse o que custasse. Saiu, mesmo assim, excitado pois que antecipava aquele evento de mais à noite.
Fiquei eu, aqui, ruminando toda essa situação. Meu filho está virando um “hominho”. Contudo, tremo em pensar que, de agora em diante, suas dúvidas e incertezas tenderão a ser cada vez mais complexas e profundas – muito além, é claro, de meros nós de gravata. Essa é prática que se aprende por simples tradição. Afinal, as gravatas são, hoje, basicamente o que já vêm sendo há muito tempo ao longo de gerações. O que me preocupa é que o mundo está, cada vez mais, exigindo habilidades tantas que, confesso, não sei se eu mesmo estou preparado para enfrentá-lo como deveria.
A vida é cheia de descobertas e desafios e isso tudo só aguça o entusiasmo do meu garotão. Torço para que chegue logo o dia em que ele venha retribuir-me, ensinando algo sobre nós que terá de aprender por sua conta e risco. Como sei de que matéria ele é feito, penso que seu sucesso é inevitável!