AMOR E OUTRAS VIAGENS
"Você é uma princesa". A frase do bilhete soara dentro dela como a mais deliciosa das verdades. Seu admirador, longe de pertencer à família real, era apenas um garoto comum que usava aparelho nos dentes. Aquele sorriso metálico havia inspirado alguns pesadelos, mas ela sempre o perdoava. Afinal uma princesa possuía nobreza de caráter.
Ambos cresceram na mesma escola, mas em turmas diferentes. Depois da encantadora declaração, ela estava completamente apaixonada, e ele, após o lampejo de ousadia, retraíra-se. Nos intervalos, porém, não desgrudava os olhos de sua princesa. Não demorou muito até que a garota percebesse o óbvio. Ele era tímido demais. E ela? Não, não. Ela não tomaria a iniciativa. Precisava de um conselho. Decidiu procurar a professora de português. Dona Yolanda costumava declamar poemas românticos no final das aulas. Certamente ninguém mais naquela escola entenderia tanto de amor.
Percorreu em segundos os longos corredores do prédio até alcançar sua mestra quase na saída. Corada pelo esforço, além do embaraço, contou tudo sem ponto nem vírgula. Dona Yolanda sorriu com o olhar distante como se sonhasse acordada. Por um momento parecia mesmo que a professora não estava ali. E então a mulher começou a chorar.
Atônita, diante das inesperadas lágrimas e soluços, a menina pediu ajuda ao professor de matemática, que acabara de abrir a porta da última classe. Dividida entre a ansiedade e o constrangimento, confidenciou sua história, e o que acontecera à Dona Yolanda. O senhor Fabrício não disse uma só palavra. Limitou-se a dar o braço para a professora, e os dois seguiram em direção à sala reservada ao corpo docente.
Sem entender coisa alguma daquela cena, a menina voltou para casa no fim da tarde. Durante o jantar conversou com os pais sobre o roteiro das próximas férias. O incidente da escola não foi sequer mencionado. Antes de dormir, sintetizou em seu diário a primeira lição que aprendera sobre o amor: "Ai, que coisa mais complicada".
(*) IMAGEM: Google
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