A CANETA DE PRATA
A caneta de prata teve o seu dia de arrojo e coragem.
Resolveu sair da gaveta, encontrou as folhas que procurava e começou a escrever a sua história.
"Cansei de ficar parada, sem atividade. Tenho saido muito pouco ultimamente.Faz muito tempo que não sou colocada, confortavelmente, em um bolso interno e macio. As vezes me colocam em bolsos de camisas e tenho tomado sol e chuva. Sou esquecida em cima de mesas empoeiradas e trancadas em gavetas, como estava até agora. Documentos importantes faz muito tempo que não nos encontramos. Pensar que já assinei contratos e cheques altíssimos. Livros de casamentos, batizados. Freqüentei escolas importantes mas, também é verdade que já escrevi em guardanapos de botequins e até algumas casas noturnas. Cheguei a assinar, relutantemente, notas promissórias e alguns cheques pré datados.Escrevi bilhetes açucarados de amor e também algumas coisas duras e ofensivas. Visitei lugares finos e, pasmem, cheguei até a escrever em delegacias e na antiga Casa de Detenção do Carandiru. Viajei muito, já assinei livros de hotéis, na Itália, Alemanhã, França e fui uma vez até Moscou!
Cheguei até a ser usada para autógrafos, imagine, do Roberto Carlos, Pelé e de mais alguns famosos por ai.
Escrevi bilhetes de mães e pais aflitos e de filhos rebeldes.
Cheguei a rabiscar folhas em velórios.
Desenhei caretas, braços, pernas. Cansei de mostrar ruas, avenidas, praças. Caí varias vezes. Tenho até algumas marcas dos tombos. Ainda bem que nunca quebrei nada, sou resistente.
Ah! De vez em quando,( detesto isso) alguma criança me pega. Ai é que vem a canseira. Sou jogada para lá e para cá. Virada para todos os lados. A velocidade é assustadora. Tenho até enjôo. Acreditem!Quando acontece isso tenho saudades da gaveta.
Bem, por hoje chega. Cansei. Quem sabe um outro dia...
José Romeu
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