Amauri, Maurinho para os íntimos, 28 anos, boa pinta, na verdade um garanhão que passava as noites, vejam só, entregando pizzas. Uma profissão como outra qualquer, mas ele entregava bem mais que pizzas nas madrugadas, o seu triciclo era bem conhecido, e o garotão era bem solicitado para a entrega das pizzas com recheio especial, carinho, muito carinho. O seu caderninho tinha telefones e endereços de várias clientes, e algumas com as inevitáveis anotações, “preferida”, “da casa” ou um dia da semana marcado ao lado, por quê? Nunca ninguém soube. Maurinho era morador da periferia, lugar de gente pobre, lutadora, mas também de violentos tentáculos do demônio, que matavam no cinza das noites e mesclavam-se a elas, desaparecendo depois. A sua rua era de poucas casas, onde todos se conheciam e aquela vizinha de Maurinho em especial, ele conhecia ainda mais, pois era cliente da pizzaria e porque não dizer a que Maurinho sabia detalhe até da vida conjugal. Sabia por exemplo que Nidal o marido era vendedor viajante, e que poucos dias da semana estava em casa. A bem da verdade no caderno de Maurinho estava anotado as “segundas e terças, quintas e domingos” "pronto pra entrega", esta era a anotação ao lado do nome da mulher de Nidal. Nidal era egípcio, morando a 20 anos no Brasil, em seus 49 anos, uns diziam que ele já fora bem melhor marido, mas que ultimamente, deduziam que, como diziam as constantes reclamações da esposa, estava deixando a desejar, e Maurinho que era vizinho próximo, tudo sabia. 15 anos mais jovem, a mulher viu no entregador de pizza, algo interessante e desde então, Maurinho era o entregador oficial, sempre ele, e sempre quando a madrugada banhava de silencio a pacata vila. Era como um fetiche, mas Maurinho vinha sempre atendê-la com apliques baianos na cabeça e um ray ban americano negro, o sorriso maroto da mulher ao vê-lo bater em sua porta a levava ao delírio. Ao lado da pizzaria ficava o vestiário dos motoqueiros entregadores de pizza e claro, também de Maurinho com seu triciclo motorizado. Tendo atendido seus clientes, na quinta à tarde Nidal estava voltando de viagem, quando seu celular tocou e alguém através de uma mensagem lhe deu dicas de onde estaria sua mulher... Meia hora depois, estacionou o seu carro numa rua atrás da pizzaria e em silencio entrou no vestiário dos entregadores, o crepúsculo o protegeu de olhares outros, pois os entregadores estavam bastante atarefados. Mas volta e meia algum deles vinha no vestiário e depois saía. No banheiro atrás de uma porta, Nidal, ouviu quando alguém aproximava, ergueu-se olhou no vitrô e viu o espalhafatoso Maurinho, adentrando na sala dos armários, deu uns seis passos, e parou atrás de Maurinho, abaixado arrumando seu coturno... ___Coloque as mãos para trás, ordenou Nidal. ___Mas... Mas... Gaguejou Maurinho ___A mão vizinho... Agora... Juntou as duas mãos de Maurinho e as algemou, depois passou duas vezes a fita adesiva na sua boca e sorrateiramente arrastou o homem e jogou no porta malas de seu carro. Por ironia talvez, Nidal vendia artigos para sex shop e então o porquê de estar com as algemas, mas o olhar frio de quem já não tem mais nada para se arrepender, era o oposto daquele homem que cumprimentava Maurinho e recebia um... ___E aí tio tudo bem? ... Acompanhado de um sorriso. 15 minutos depois, no silencio de um matagal na serra, um celular tocava e pedia uma pizza, “como de costume”. Nidal guardou algo num pequeno saco plástico, e respondeu ao celular... ___Já estaremos lhe entregando Senhora, aguarde, por favor... Passou o punhal uma duas vezes num monte de terra, e o guardou por dentro em seu paletó. Andou até a beira do precipício ali ao lado, deu uma cusparada e murmurou... ___Hora de entregar o pedido. O som estridente dos canos de escape do triciclo de Maurinho ligou o alerta da mulher de Nidal. E a cada vez que se aproximava mais, a mulher se contorcia em pré êxtase, pois sentia no ar o perfume de Maurinho... Ao estacionar em frente a casa, a luz do triciclo foi apagando-se devagar, e somente no breu da noite é que o entregador dirigiu-se a porta. A mulher olhou no olho mágico e sorriu, as longas cabeleiras em apliques, óculos ray ban, lhe banhava a alma de um desejo incontido. Abriu a porta, virou-se e pediu para o entregador entrar... Ele entrou, caminhou até a mesa colocou a pizza em cima, pigarreou e perguntou de cabeça baixa... ___Posso abrir? ___Fique a vontade meu amor... Disse a mulher. Ao destampar a pizza, o entregador lhe sorriu e perguntou se estava como pedira... ___O queijo branco espalhado sobre a pizza, trazia em coloração vermelha uma enorme cruz desenhada em seu meio, e mais ao lado o dedo ainda pulsante de Maurinho. A mulher empalideceu, e a medida que Nidal ia tirando a parafernália que Maurinho usava pra seduzir, o transtorno dava a certeza de que mais perto estava do inferno que os olhos de Nidal prometiam... Lentamente ele foi andando para perto dela... Rebuscando dignidade na alma frágil para ter uma morte digna a mulher balbuciou... ___Perrrrrdãoooooooo... Da mão de Nidal o punhal, que vertia ódio passeou entre as carnes da mulher num vertical movimento de cima para baixo, expondo as vísceras como se um livro desfolhado fosse o abdômen da pobre mulher... Terminando no alto a trajetória, e recomeçando agora na horizontal a sevícia de um corpo que jazia ensopado de sangue e que a mão sanguinária de Nidal só reconheceu como sem vida, quando o sangue espalhado no chão era todo o existente e que um dia deu vida aquele corpo despedaçado. Quando a sanha diabólica satisfez o ímpeto de Nidal, ele ainda tinha um pedaço do braço da mulher na mão... O atirou longe, passou a manga da camisa na boca, e respirou fundo, balbuciando... ___Pronto, tudo feito... E um sorriso diabólico lhe sombreou a face...