NARINHA E O JARDIM

NARINHA E O JARDIM

Narinha era uma menina muito especial, meiga e sensível. E apesar de viver no seu próprio mundo, estava sempre atenta a paisagem e a tudo que acontecia ao seu redor. Todos os dias ao voltar da escola passava pelas mesmas ruas, mas naquela tarde resolveu mudar um pouco sua rota. Foi então, que ao passar por uma determinada rua seus olhinhos se depararam com um jardim que lhe chamou a atenção.
Era um jardim que ficava no quintal de uma casinha branca muito simples, mas que tinha uma ternura e uma "singeleza" que encantou Narinha quase de imediato. Não resistindo àquela visão, ela se aproximou meio tímida até a cerca da casa para poder olhar melhor. Era como se o jardim a chamasse na sua direção. Quando parou em frente a cerca, Nara percebeu que apesar de bonito, o jardim estava com suas flores um pouco murchas. O que não diminuía em nada a atração que sentia por ele.
Ela estava tão fascinada com o que via que nem notou que alguém se aproximava. Era o dono da casa, um senhor muito simpático e gentil que se comoveu com o olhar de encantamento da menina... Era um senhor alto, usava roupas claras, com um ar e um andar suave como a casa. Tão suave, que Narinha nem percebeu a sua aproximação.
Depois de admirar aquela cena por alguns instantes, ele quebrou o silêncio e lhe disse: - Boa tarde! Quanta honra em ter meu humilde jardim a ser admirado por tão linda moçinha!
Ele falou de forma tão branda que ela, apesar de meio “bicho do mato”, nem se assustou. E retribuiu o comentário com um sorriso tímido e uma carinha de envergonhada que conquistou o dono da casa.
A partir desse dia, Narinha passou a visitar o jardim da casa todos os dias depois da escola. Criando com isso um forte laço carinhoso entre ela e aquele gentil senhor. Unindo-se a ele na incumbência de cuidar do jardim.
Depois de alguma conversa ela descobriu o motivo das flores parecerem meio murchas apesar do carinho que recebiam do moço. Ele explicou a ela que não havia muita água disponível no terreno. E que ficava muito difícil para ele carregar sozinho toda a quantidade necessária, uma vez que o jardim precisava ser regado duas vezes ao dia.
Então por iniciativa própria, Narinha reorganizou seus horários e tarefas de forma a poder ir todos os dias a fonte pegar dois baldes com água para ajudar na manutenção daquele jardim que ela, assim como ele, começou a amar.
E assim fez dia após dia. E junto com as flores que desabrochavam crescia a amizade entre Narinha e aquele senhor, até se transformar na mais linda relação de carinho! Enquanto regavam o jardim conversavam muito. Contavam histórias, aprendiam um com o outro, sorriam... E a felicidade inundava o ambiente.
Certo dia, da mesma forma que naqueles que o sucedeu, Narinha foi até o portão da casa com um balde em cada mão. Chamou, chamou e ninguém atendeu. Achou estranho pois sabia da importância que tinha o jardim para eles dois. Sentou-se então junto ao portão, na esperança que seu amigo aparecesse. Mas, que nada! Ninguém apareceu. A noite começou a cair, as luzes das ruas foram acesas e a casinha permanecia na escuridão. Então com os olhos tristes, Narinha deixou os baldes em frente ao portão e voltou para casa bastante preocupada. Afinal, o que teria acontecido? Onde estaria seu amigo? E as flores, como ficariam?
Essa cena se repetiu por sete dias, e a cada dia que se passava sem notícias, mesmo não abandonando seus afazeres e controlando seu coração para que a tristeza não lhe tomasse conta. A angustia em seu peito aumentava de forma discreta sim, porém, importante.
Um belo dia quando suas esperanças começavam a vir por terra. Eis que Narinha vê seu amigo a sua espera no portão! A angustia no seu peito deu imediatamente lugar a um sorriso de imensa felicidade. E seu coração em silêncio gritou para sua mente: - Viu? Ele voltou!
Ela não conseguiu se conter e foi correndo abraçá-lo com os olhos cheios de lágrimas. E depois de alguns segundos perguntou a ele:
- O que houve com o senhor? Fiquei tão preocupada!
Então ele explicou que adoecera, e que teve que ficar na casa de parentes para poder se tratar já que não tinha recursos ali. Também contou que ainda não estava de todo recuperado tendo que fazer um tratamento delicado. Mas, que não pode se afastar da sua amizade e nem do Jardim que ambos cultivam com tanto carinho.
Narinha olhou para ele com carinho, deu-lhe outro a braço e um beijo. E sem nada dizer, tomou pra si a responsabilidade quase que total de manter o jardim florido, deixando seu amigo encarregado de abrir o portão. E assim foi, ela mais uma vez reorganizou sua vida. Espremendo-se entre as suas tarefas, que continuavam as mesmas, para trazer religiosamente água para as flores que eram regadas ao som dos costumeiros sorrisos e banhadas de felicidade.
Até que mais uma vez o portão não foi aberto. Seu amigo estava internado para exames, e pediu aos vizinhos para abrir o portão pra que Narinha pudesse regar as flores. O que infelizmente não foi feito. Mas ela não se aborreceu, pois sabia que todos tem suas ocupações. E na verdade o Jardim era dela e do amigo, e por mais que as pessoas achassem bonito, não tinha a mesma importância para elas que tinha para eles dois.
Com o retorno do amigo a tudo voltou também ao normal. Na verdade é isso que importa, e as flores sabem disso.
Mas com tudo isso, a rotina do amigo foi muitto alterada. Além do tratamento ele, da mesma forma que ela, tinha seus afazeres pessoais entre os quais ele se equilibrava para estar disponível. E abrir o portão para estar a regar o Jardim ao lado daquela menina que lhe era tão querida.
Porém... Narinha percebeu que mesmo com todo o gostar, toda vez que ele se deprimia com a sua doença, ou ficava atarefado por algum motivo, não abria o portão. Deixando que ela ficasse lá a espera às vezes por horas. Dada a situação e ao seu gostar, Narinha entendia tudo pacientemente, apesar de sentir um pouco. Mas, para que serve o gostar se não tivermos paciência e generosidade para com quem gostamos? Ela se perguntava. A resposta era sempre um sorriso carinhoso.
Certa manhã, ela foi na casa do jardim com novas sementes que ela carregava com todo o carinho e deixou no portão com um bilhete que dizia assim: “ Bom dia! Trouxe com carinho, para deixar nosso jardim mais bonito.” E foi em direção a escola.
Mas sua ansiedade foi tanta que não resistiu, voltou e viu que as sementes foram recolhidas e estavam em um banquinho ao lado do jardim. “Que maravilha!” Pensou ela. Bateu duas vezes no portão e, como às vezes acontecia, ninguém atendeu. Ela ficou um pouco frustrada, mas não ligou muito. Seu amigo devia estar ocupado, e seguiu para a escola ansiosa para saber se ele havia gostado das sementes e pela hora de plantá-las.
Naquela tarde obviamente ela foi até lá. Mas resolveu fazer diferente das outras tardes. Estava muito ansiosa e não queria que sua ansiedade sufocasse o amigo. Então resolveu passar por lá e não chamar. Se ele estivesse esperando no portão tudo bem, se não, plantariam no dia seguinte. Só que bem lá no fundo, contava vê-lo. Mas o portão estava vazio, e Narinha passou direto contando com o dia seguinte... O dia seguinte passou e nada!
No início da noite, ela por já não agüentar mais de tanta ansiedade, pegou os baldes com água e rumou até a casa do amigo. Quando lá chegou, encontrou um bilhete no portão respondendo o Bom dia que dera no dia anterior e avisando que um parente querido estava sentindo-se mal e que ele teria ido levá-lo ao hospital. Narinha sentou no portão, e seu coração dessa vez bateu dolorido e disse “Poxa!”. Ela então se levantou, deixando lá os dois baldes com um bilhete solidário e foi pra casa dormir.
Na manhã seguinte acordou triste e com os olhos úmidos. Respirou fundo, ficou algum tempo em silêncio sentindo a umidade do seu coração e depois disse a ela mesma: “Quando der eu rego. Agora vou levantar e fazer meu dever de casa.”
E o Jardim? Ah, o Jardim continua bonito!
Bom Dia :-)!



"Um dia vou fazer um pedido a uma estrela
Pra acordar onde as nuvens estão lá em cima, bem atrás de mim!
Aonde os problemas derretem como balas de limão
Bem acima do topo das chaminés, que é onde você me encontrará.
Oh, Em algum lugar além do arco Iris, bem lá no alto!
E o sonho que você ousa desafiar... Por quê? Porque eu não posso?"


( Trecho de "Somewhere over the rainbow" traduzido)



Conto do meu livro "As Memórias de Narinha". Também disponível em audio nesse site.

cinara
Enviado por cinara em 14/11/2009
Reeditado em 25/02/2023
Código do texto: T1922984
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