Morfossintaxe, logaritmo, feudalismo, classificação periódica dos elementos,... Isso era tudo em que conseguia pensar, enquanto roía compulsivamente as unhas no trajeto até o “matadouro”.
Acalma-se ao chegar, pois percebe que não está só. Mas bastou prestar atenção nas expressões ansiosas daquelas pessoas à sua volta, para que o nervosismo dominasse novamente todo o seu corpo.
Entra na sala indicada e acomoda-se. As mãos trêmulas não sabem o que fazer. Mexem na caneta preta, buscando, talvez, a melhor forma de segurá-la.
Sua introspecção é interrompida quando uma espécie de apostila é colocada sobre a mesa à sua frente.
A tensão aumenta. Respira profundamente e abre a tal apostila.
Letras e números, como num passe de mágica, saltam da folha, fazendo caretas, correndo, pulando, dançando,... Apenas para confundir e tirar sua atenção. Finalmente, quando está quase gritando tamanha a loucura... Acorda!
Com o coração ainda acelerado, olha para os lados, reconhece o quarto e conclui: “Tudo não passou de um sonho ruim! Foi só um pesadelo!”.
Depois de tomar um reforçado café-da-manhã, encaminha-se até o endereço marcado num pedaço de papel, ao lado de seu nome e uma foto 3X4.
Como no sonho, ao chegar encontra todos aqueles rostos ansiosos. “Será que tudo que vivi no sonho, vai se repetir?” - pensa. Mas, desta vez, uma estranha segurança acompanha cada um de seus passos até seu lugar na sala.
Já com a caneta preta em punho, espera a tão temida apostila com as questões do vestibular. Quando abre... UFA!!! As letras não estão fazendo caretas ou dançando! Mas ganham vida quando juntas na leitura formam frases e perguntas. Perguntas que responde quase que automaticamente. Algumas com a certeza de quem estudou muito durante as férias de verão. Outras, como quem brinca de “minha mãe mandou”.
O silêncio da sala sendo cortado pelo tic-tac do relógio começa a incomodar. Porém nada é capaz de tirar sua concentração na tentativa incansável de lembrar as “Leis de Newton”, sobre a qual tem certeza de ter lido algo no livro de Física!
Quando termina, tampa a caneta, dá uma última olhada na prova, entrega e sai do prédio em desespero. Nunca, em toda a vida, desejou tanto deixar um lugar, como naquele momento. Tá! Exceto aquela vez em que saiu correndo do dentista ao descobrir que estava com uma cárie. E foi com este mesmo impulso que tomou o caminho de volta para casa.
--... Acho que fui bem! – É dessa forma que encerra o relatório completo do dia prestado à família que se encontrava reunida em casa, aguardando sua chegada.
Vai para o quarto. Precisa relaxar e esquecer as fortes emoções do dia. E, com a cabeça no travesseiro, deixa-se vencer pelo cansaço e dorme.
Vê-se então, numa sala fria e muito iluminada. À sua frente, um quadro negro, no qual alguém escreve rapidamente, de modo que precisa passar a usar a porta e as paredes para continuar naquele ritmo frenético, que é acompanhado pelo som irritante do giz ao ser forçado pela mão a escrever milhões de palavras sem sentido.
A mãe quase derruba a porta do quarto, pois veio correndo ao escutar um poderoso:
-- NNNNNÃÃÃÃÃÃOOOO!!!!!!!!!!!!!!!!
Mais um pesadelo!
Desde o momento em que fez a inscrição para o vestibular, não pensa em outra coisa. Mesmo quando tenta, em vão, desligar-se, o inconsciente trata de trazer à tona todos os seus temores.
Na próxima noite, talvez sonhe com o trote, que os impiedosos e vingativos veteranos, lhe darão no primeiro dia de aulas na faculdade...