Não quero teu perdão, não quero!
Eu quero a punição, a solidão.
Quero na minha carne a ulceração,
Da ferida que em ti causei.
Quero pregos nos meus pés e mãos,
E que me prendas na cruz que eu mesmo criei.
Quero que me açoites e me acorrentes,
E depois me afogue na água e sal,
Do mesmo pote que te fiz beber.
Quero que, fio a fio, arranques meus cabelos,
E me traga a público, todo o meu remorso à luz.
E, sem piedade, que todos riam,
E não satisfeitos, que me pisem e me xinguem.
Quero dormir no relento, viver na sarjeta,
Alimentar-me de lixo e beber lodo.
Quero ver meu corpo esquartejado,
E em cada poste, uma parte pendurada,
E minh'alma, para sempre a paz negada.
E então, o que de mim sobrar,
Se por ventura suas mãos vierem a recolher,
O prenúncio da chama irá germinar,
E a vida em mim reflorescerá,
E na sua plenitude, que eu venha a louvar,
A semente que, no apocalipse,
Negou-se a morrer.