UM HOMEM, UMA MULHER E DOIS MUNDOS
No exato instante em que Alice abriu a porta do amplo apartamento, o telefone começou a tocar. Antes de se aproximar do aparelho ela já sabia que era o tal sujeito. Desde aquela noite no bar, quando por acaso o encontrou, o homem insistira em dizer que a conhecia e desta vez, não iria embora, repetindo a história tantas vezes que, por um momento, ela se viu nas cenas descritas. A brevíssima sensação de reconhecimento levou Alice a imaginar pertencer a dois mundos, como se sua alma tivesse se dividido e outra Alice, fora de seu alcance, vivesse numa dimensão paralela, onde tudo aconteceu. Se ao menos aquele homem parasse de falar das coisas que ela não sentiu, mas de tanto ouvi-las, estava a um passo de desejar ter vivido.
O toque do telefone a trouxe de volta para sua sala. Alice atendeu:
— Diga.
Com a voz mansa, o homem perguntou:
— Você quer ouvir?
Ela respondeu com outra pergunta:
— Faz alguma diferença se eu quero ou não?
Alice ouviu a respiração funda do sujeito do outro lado da linha. E então ele disse:
— Você pode desligar.
Não. Ela não podia. As palavras daquele homem a ligavam a uma espécie de segunda vida. Por um longo tempo os dois permaneceram calados até que Alice pediu:
— Conte a história mais uma vez.