Tenho pena
de não ter penas
e asas,
penas fortes e sedosas
numas asas vigorosas
sulcando todos os ares.
E não apenas as penas
nem as asas...
Tenho pena de não ser
uma gaivota
muito calma
e muito ousada
libertada
dominando
terra e mar.
Tenho pena
de não ser uma gaivota
p’ra voar
na noite da tua insónia
e penetrar no teu quarto
e pousar sobre os teus ombros
e em teu peito repousar.
Tu ias adormecer
com as minhas penas suaves
o teu corpo a acariciar,
com cantigas
murmuradas
em voz rouca,
soluçadas
azougadas.
Aconchegada por ti
ao teu peito,
amada p’las tuas mãos
sentiria nessa noite
orgasmos no coração.
E quando o dia rompesse
e eu tivesse de voltar
tivesse de te deixar,
então em grito pungente
numa revolta de amor
e num quebranto de dor
haveria de ter pena
de ter penas p’ra voar.