QUANDO CHEGA A INVERNADA.
A SECA É NOSSO DILEMA
É NOSSA DOR, NOSSA ALGEMA
E ESSE TRISTE PROBLEMA
SÓ QUEM RESOLVE É JESUS.
E LÁ NO CÉU ELE ESCUTA
NUMA CASINHA DA GRUTA
ONDE A FAMÍLIA MATUTA
REZA AO PÉ DA SANTA CRUZ.
A ESTIAGEM SE ENCERRA
O INVERNO ENVOLVE A TERRA
MOLHA A CHAPADA DA SERRA
ALEGRANDO OS LAVRADORES.
O NOSSO SERTÃO SE BANHA
ESVERDEANDO A MONTANHA
A NOSSA FLORESTA GANHA
RAMAGEM, FRUTAS E FLORES.
QUANDO O INVERNO APARECE
A CHUVA NOS FORTALECE
SÓ ASSIM A GENTE ESQUECE
OS LADRÕES DESSE PAÍS
O BARULHO DA BIQUEIRA
O RONCO DA CACHOEIRA
AS FLORES DA QUIXABEIRA
FAZEM A GENTE FELIZ.
UMA NUVEM RELAMPEJA
A CUMEEIRA GOTEJA
O SAPO ALEGRE FESTEJA
O GADO SE AMONTOA.
QUANDO VER O CHÃO MOLHADO
O TOURO EMOCIONADO
ENFIA O CHIFRE AMOLADO
NO PAREDÃO DA LAGOA.
QUANDO A CHUVA SE APROXIMA
MUDA O TEMPERO DO CLIMA
JESUS MEXE LÁ EM CIMA
NO AZUL DO FIRMAMENTO.
A LUZ DO SOL PERDE O BRILHO
CORRE O VAQUEIRO E O FILHO
E UMA PALHA DE MILHO
SOBE NAS ASAS DO VENTO.
POR ORDEM DO CRIADOR
AS NUVENS MUDAM DE COR
E LÁ NO CÉU O PINTOR
QUASE NÃO LARGA O PINCEL.
O SOL ESCONDE SEU DISCO
E O FOGO DO CORISCO
DESCE FAZENDO UM RABISCO
NO QUADRO NEGRO DO CÉU.
BERRA UMA VACA HOLANDESA
SE APAGA A FOGUEIRA ACESA
O SOL COM SUA GRANDEZA
DESAPARECE NA SERRA.
NUVEM DE LESTE A OESTE
COBRE SERTÃO E AGRESTE
UM FORMOSO ARCO-CELESTE
DÁ UM ABRAÇO NA TERRA.
DESPENCA ÁGUA DA SERRA
CAVANDO REGO NA TERRA
LÁ EMBAIXO O RIO BERRA
NO ALTO RONCA O TROVÃO.
EU ME SENTO NA CALÇADA
COM A VIOLA AFINADA
E A SAUDADE ENGANCHADA
NAS CORDAS DO CORAÇÃO.
NA FORÇA DA TROVOADA
VOA BAIXO A PASSARADA
UM GATO NA DISPARADA
QUASE NÃO PISA NO CHÃO.
CAI A PALHA DO COQUEIRO
CANTA O SAPO NO BARREIRO
O VENTO TRANSPORTA O CHEIRO
DA FLOR DO MANJERICÃO.
O PASTO VERDE SE ENTULHA
TODO SERTÃO SE ORGULHA
E O POETA MERGULHA
NO LUAR DA INSPIRAÇÃO.
O POVO VENDO A NEBLINA
AGRADECE A MÃO DIVINA
QUE RESSUSCITA A CAMPINA
COM ÁGUA ENSOPANDO O CHÃO.
UM CANARINHO SE ATRASA
LEVANDO A BÓIA PRA CASA
ENCHARCA AS PENAS DA ASA
DO VENTO LEVA UM AÇOITE.
QUANDO O LUAR VAI EMBORA
UM RAIO DE SOL AFLORA
E A BORRACHA DA AURORA
APAGA O QUADRO DA NOITE.
QUASE A TERRA VIRA LAMA
O FEIJÃO SE ESPARRAMA
O JERIMUNZEIRO ENRAMA
O MILHO VERDE ENCAROÇA.
TEM PÉ DE FAVA ENROSCADO
TEM PÉ DE MILHO EMBORCADO
A FORMIGA FAZ UM BORDADO
NA ROUPA NOVA DA ROÇA.
O ZELADOR DA IGREJA
PEDE QUE DEUS LHE PROTEJA
QUANDO O TROVÃO SACOLEJA
OS VIDROS DUMA JANELA.
QUANDO VEM DO INFINITO
UM RAIO DÁ UM APITO
CLAREIA SÃO BENEDITO
LÁ NO ALTAR DA CAPELA.
NO SILÊNCIO DO ROÇADO
TEM UM BEZERRO ATOLADO
TEM UM FAXEIRO VIRADO
TEM UM SABIÁ CANTANDO.
UM BOI PUXANDO UM ARADO
UM MENINO RESFRIADO
É ÁGUA PRA TODO LADO
É PASTO VERDE SOBRANDO.
DE TÃO ANTIGO O TELHADO
JÁ ESTÁ ESBURACADO
O PISO FICA ENCHARCADO
NA HORA QUE A CHUVA VEM.
LEVANTA A MÃE DE FAMÍLIA
VAI COLOCANDO VASÍLIA
SÓ NÃO PROTEGE A MOBÍLIA
PORQUE MOBÍLIA NÃO TEM.
A LAGOA SE ENLAMEIA
O SANGRADOR SERPENTEIA
E O RIACHO ESPERNEIA
COM O PESO DA ENCHENTE.
A LUA COM TIMIDEZ
MOSTRA A SUA PALIDEZ
DUPLICANDO A MACIEZ
NO FIM DO QUARTO-CRESCENTE.
O VENTO INVADE A COLINA
A CHUVA COBRE A CAMPINA
O TROVÃO SEM DICIPLINA
INVADE TODO O ESPAÇO.
UM BANDO DE PERIQUITO
FAZ UM BARULHO ESQUISITO
COBRINDO O CANTO BONITO
DO SABIÁ NO TERRAÇO.
ROLA ÁGUA PELA ESTRADA
VAI-SE A NOITE ENLUARADA
A CHAVE DA MADRUGADA
ABRE A PORTEIRA DO DIA.
VEM O SENHOR DOS SENHORES
PROTEGENDO OS LAVRADORES
E EU VOU COLHENDO FLORES
NO JARDIM DA POESIA.