És assim: um estorvo, um estafermo, um zero, um nada. Talvez seja uma praga, uma sina, um destino traçado do qual não consegues fugir.
Teu nascimento foi um acidente. Lembras que te disseram que a cama quebrou? E que a parteira demorou e quase morrestes asfixiada? Daí pra frente tua estadia tem sido um completo engano. Tudo que queres, não consegues. Tudo o que sonhas, não realizas. Tua vida é um desacerto. É um espectro. Aos doze, quase estuprada, além do medo ainda tiveste que suportar as brincadeiras de irmãs e amiguinhos de escola. O rosto arranhado, o dedo quebrado, a roupa rasgada... Planejaste morrer e não morreste. Aos quinze realizaste algo bom, criaste uma pequena escola. Planejavas ganhar algum dinheiro. O pagamento atrasou e teus sonhos foram dizimados. Um só par de sandálias, dentes cariados a tratar, sonhos desmoronando. Sonhar com potes de geléia e acordar apalpando as paredes. Sabes o que é chorar nas madrugadas por não ter um copo de geléia? Nem pra si nem para o irmãozinho? Um, dois, três, quatro e cinqüenta anos se passam. Ainda choras como um bebê pelos sonhos desfeitos... Vais morrer e serás sempre a abobalhada, favelada, inconveniente, louca. Esperas piedade?Ninguém tem piedade de uma parva. Queres ser amada? Homens não amam mulheres que são espectros, chatas ou loucas. Vais morrer e terás uma coroa de flores. Achas pouco? ***************************** Veja o E-BOOK