Eu canto porque sou voz,
cantor só, e sem ter fãs.
E também que sou feroz:
eu canto para as manhãs.
Canto como quem respira:
sem fronteiras ou amarras.
Canto como quem suspira,
eu canto como as cigarras.
Canto com o amor à vida
e aquilo que dela é bom.
Se morrer, canta essa amiga,
mesmo que fora do tom.
Eu canto a palavra esperta,
aquela que vai sem rima.
Eu canto essa flecha certa,
que, a nós, derruba e anima.
Eu canto sem pejo algum,
como quem se sabe nua.
E canto o lugar-comum,
do alto da estrela crua.
Eu canto esse desespero,
esse mar, essa agonia.
Eu canto esse teu desdém,
refém da melancolia.
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