DROIT & CROISSANT
Lílian Maial
Quando nasci, não veio anjo nenhum,
só um tapa desses bem dados na bunda,
que era para eu já ir-me acostumando.
E houve quem dissesse: Chora, criança, que é sinal de saúde.
Minha mãe me achou muito feia,
meu pai me queria homem.
Só minha avó, escondidinha nos pensamentos,
me reservava um destino "droit",
que de "gauche" já bastavam o mundo e os anjos.
A praga de vó deu certo,
e a lagarta voou borboleta,
aprendeu a parir asas de não sei onde,
a se fantasiar de arco-íris e ver estrelas.
Tudo culpa de um vírus que peguei inda menina.
Todo mundo tinha catapora,
eu tinha poesia.
E tinha a bronca do tal anjo,
que chegou atrasado naquele Carnaval,
correndo que estava atrás das pernas todas,
de homens e mulheres,
que anjo não tem sexo.
Até hoje o caído me tenta,
me suborna com os croissants de Maria Antonieta,
mas eu estou mais para a rapadura de Maria Bonita.
Meu Deus, por que não me contaste,
se sabias que eu era Deus,
se sabias que eu era Mulher.
Meu vasto mundo é o universo,
não me chamo Raimunda,
não me chamo Rosa,
e minha rima é pobre,
meu vasto mundo é verso e prosa.
Eu não devia dizer a Drummond,
mas esse vírus não tem cura,
passa através da leitura,
se multiplica com um doze anos,
e bota a gente com jeito de solidão,
mas dá um barato dos diabos!
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