SOB ALTA TENSÃO...

SOB ALTA TENSÃO...

Daqui do alto a procurar pelos milagres urbanos...

A tarde acabava de cair com aquele colorido próprio do verão.

Um ar morno me batia à face, e da sacada da sala eu indiretamente buscava pelo pôr do sol laranja-carmim refletido nas vidraças da vizinhança.

Na interface dos meus olhos, um emaranhado de fios elétricos e de telefonia, fazia um desenho abstrato a contrastar com o colorido céu vespertino, e eu desejei poder observar aquele espetáculo menos dilapidado.

Fazia tempo que não nos víamos, e de repente, avistei a sua casa.

De arquitetura humilde, porém de arte requintada na construção, milimetricamente planejada, ensinava que não era apenas eu que buscava pelo espaço duma natureza mais virgem, mais harmoniosa.

Entre dois enormes transformadores de alta tensão, situados em meio a calçada, eu fiquei ali esperando que ele chegasse para lhe desejar boa noite.

Vindo do crepúsculo, na mesma brisa já fresquinha, ele chegou exausto e ofegante e eu o vi adentrar pela sua porta sem tramelas, para o sono ingênuo e desprotegido dos que habitam a cidade grande...e cinza.

Parecia assustado...

Em pensamento, eu lhe desejei boa noite.

-Bons sonhos, João querido! Que Deus lhe proteja!

Ele, que um dia já foi “de Barro”, perdeu seu sobrenome, e sem identidade, assim como eu, sequer se reconhece no concreto apinhado...