Só uma coisinha (para Rosa Pena e seus lobos)
De volta ao trabalho nesta segunda-feira, dedicarei menos tempo ao nosso Recanto, mas pretendo postar pelo menos alguma coisinha por dia. Aliás, deveria haver aqui uma seção sob o título "Só Uma Coisinha" (rs).
Para fugir da megalomania que às vezes caracteriza meus artigos, vou falar hoje sobre a música que vinha ouvindo no carro. São na verdade duas numa mesma faixa, a de número um do disco ao vivo "Friday Night in San Francisco", com John McLaughin, Al di Meola e Paco de Lucia (Philips-Polygram): Mediterranean Sundance(Meola) e Rio Ancho (Lucia), gravadas já no distante ano de 1980.
Peço humildemente a vocês que ouçam esse negócio. É de tirar o fôlego a profusão de solos e rifes (misto de solos com acordes). Esses três monstros do violão flamenco traçam um enredo sonoro de extrema complexidade, em ritmo frenético, movido por um sentimento passional que parece querer esgotar as possibilidades de expressão dos temas. São onze minutos e 25 segundos de peripécias que podem transportar o ouvinte num galope por terras dominadas por ciganos, batalhas com mouros, histórias de cavaleiros andantes e paixões arrebatadoras. Os três chegam quase à falta de limites, rompendo fronteiras harmônicas, com o transbordamento da tonalidade. Como se puxassem a rédea de seus cavalos na borda de um território inimigo, recuam, sem, no entanto, dar descanso ao ouvinte, que vem só quase ao final, também eletrizante.
De tão vasta a paisagem percorrida, poderia explicar a história, o caráter e os costumes de uma região. Mas acho que vai além disso. É uma explicação do Universo. Só que não traduzida em palavras, o que mantém a impenetrabilidade do mistério.