Três mulheres
Ainda no clima emocional do Dia das Mães, dias depois eu folhava um jornal quando me deparei, em páginas diversas, com a história de três mulheres. A primeira delas é a polonesa Irena Sendler, falecida no dia 12 de maio, aos 98 anos, em Varsóvia. Ela ajudou a salvar, usando métodos incríveis, mais de 2,5 mil crianças judias, confinadas pela Gestapo no horrendo Gueto de Varsóvia, onde as chances de sobrevivência eram mínimas.
Em 1943 ela foi presa e torturada pelos nazistas, sofrendo terríveis tormentos. Teve as pernas quebradas, e mesmo assim não revelou o nome das crianças nem o endereço das famílias adotivas.
Irena é uma heroína cuja candidatura ao Prêmio Nobel da Paz foi solicitada pelo presidente Lech Kaczynski, em um manifesto assinado por mais de 14 mil personalidades. Irena Sendler havia recebido em 1965, no Memorial do Holocausto em Tel Aviv, o Yad Vashem (título de “Justo entre as nações”), destinado aos não-judeus que ajudaram a salvar judeus. Entre os ganhadores dessa honraria está o checo Oskar Shindler († 1974).
Na frase abaixo, vemos o caráter dessa mulher corajosa: “Cada criança salva com a minha ajuda é a justificação de minha existência na terra, e não um título de glória”.
A segunda mulher, no mesmo jornal, na página de “negócios” é a atriz Glenn Close que, em sociedade com o marido, e bem dentro do espírito mercantilista americano, criou uma empresa de artigos de luxo para cachorros, o que está lhe rendendo lucros astronômicos.
Enquanto Irena se preocupou com os refugiados da guerra, Glenn Close, que não tem filhos, trata do bem-estar dos cachorros dos outros. Com tanta coisa mais humana para fazer, ela se dedica aos bichos.
O nome da terceira mulher eu nem vou dizer. Ela não merece figurar num artigo cujo personagem principal é Irena Sendler. Trata-se da brasileira, madrasta da menina Isabela Nardoni, assassinada por ela e pelo pai Alexandre. As notas do jornal, já em páginas inexpressivas e espaços diminutos, falam que ela está assustada com as agruras do cárcere.
Enquanto uma salva crianças, filhas dos outros, a outra cuida dos cães alheios, esta, que podia assumir um papel melhor, mais nobre e mais humano, no revés da ética e da generosidade, se transforma na bruxa malvada da história, correndo a partir de seus atos, os riscos pela atitude assumida.
Como é que pode haver, em quadrantes tão distintos do mundo três mulheres tão diferentes, retratadas numa mesma edição de jornal. Uma heroína, uma fútil e uma acusada.
Isto tem que ter fim!
Eu tinha anotado este fato e o perdi em minha agenda. É para ver como certas “campanhas educativas” se perdem na retórica. No dia 20 de fevereiro passado eu voltava da praia, pela “Estrada do Mar”. Era mais ou menos 15h. Aproveitando um espaço “inter-pardais” eu dei uma apertada no acelerador até os 90 km/h. Nisso, passou por mim (eu ia a noventa) uma Parati branca, com três pessoas a bordo. O veículo pertencia à RBS, e em sua lataria, em um adesivo havia uma ironia: “Isto tem que ter fim”.