Comida ou papel?
Após tantos absurdos, constata-se que as empresas de celulose passarm a determinar a política ambiental no Rio Grande do Sul. As multinacionais reclamaram dos entraves legais e ambientais para a expansão de seus negócios. Após a pressão, o Governo do Estado demitiu a Secretária do Meio Ambiente e o Presidente da fundação responsável por emissão de licenças. Como são proibidos produzir celulose na Europa, vêm fazê-lo aqui.
As empresas de celulose vêm aumentando progressivamente sua capacidade de influência no Estado, desempenhando um papel fundamental na definição de políticas na área ambiental. O lobby das empresas Aracruz, Stora Enso e Votorantim (VCP), que já era forte durante o governo anterior ficou ainda maior.
Após as demissões, as licenças ambientais começaram a ser emitidas rapidamente. Cada vez mais forte, o eucalipto avança pelo pampa gaúcho, repetindo movimento que ocorre também no Uruguai. O poder de influência do setor de celulose apóia-se em duas pernas: a política e a mídia. As verbas publicitárias aplicadas nos principais veículos de comunicação do Estado garantem uma cobertura simpática e, não raras vezes, militante em defesa dos projetos de expansão do plantio de eucalipto e pinus e de construção de fábricas de celulose no território gaúcho. É interessante observar como as licenças da Fepam, sempre tão morosas, nesses casos tornaram-se céleres.
A estratégia de conquista da opinião pública é explícita. Em um artigo publicado no site da Aracruz, um executivo da empresa, afirma que “a inteligência empresarial considera estratégico e sensato aproximar-se dos jornalistas e tratar a comunicação, nas suas múltiplas vertentes, como um diferencial fundamental”.
As empresas de celulose trabalham amiúde com essa regra. Em novembro de 2006, a Stora Enso levou um grupo de jornalistas gaúchos para visitar a sede da empresa na Finlândia. Integraram a comitiva “aqueles” jornalistas que se conhece, de ranços neoliberais. Um dos mais deslumbrados escreveu em seu blog: “Os investimentos que mudarão a face econômica da empobrecida metade sul têm sido bombardeados por ONGs e pela esquerda em geral, que falam a torto e a direito na criação de desertos verdes. São mentiras e bobagens que, repetidas, podem virar verdade na cabeça de muita gente”.
Impedida, por força de lei, de fixar investimentos estrangeiros em faixas de fronteira, a Stora Enso teria constituído uma nova empresa, a Azenglever Agropecuária Ltda., com capital social brasileiro, que passou a adquirir as terras na fronteira. Plantar eucaliptos não é reflorestar, mas dar curso a uma fraude. Nada substitui a mata nativa derrubada no passado.
Na zona sul do estado, onde aquelas empresas querem plantar eucalipto para produzir celulose, já tem gente vendendo terras de plantio de arroz. Já perdemos terras de trigo, feijão, soja e suinocultura. Troca-se comida por celulose. Em 28 de julho, o jornal Zero Hora (pág. 29) anuncia a “suba” do preço do arroz gaúcho. Teria alguma relação?
A mídia gaúcha, sem exceção está cooptada no grande lobby das "papaleiras". Curiosa e sintomaticamente, mandei este artigo para ser publicado no jornal ZERO HORA de Porto Alegre, que o ignorou.
Filósofo e escritor. Doutor em Teologia Moral.
Especiallista em Bioética