A VERDADE, O BEM, O MAL E UMA HISTÓRIA DE GATOS

"Vigie seus pensamentos,

porque eles se tornarão palavras;

vigie suas palavras,

porque eles se tornarão atos;

vigie seus atos,

porque eles se tornarão seus hábitos;

vigie seus hábitos,

porque eles se tornarão seu caráter;

vigie seu caráter,

porque ele será o seu destino."

(Ditado moralista - desconheço o autor)

Outro dia publiquei no recanto uma história de gatos, que depois exclui por julgá-la inoportuna.

Na vida, devemos ter sempre cuidado com as palavras, principalmente com as escritas.

"Toda a nossa dignidade consiste no pensamento. Cuidemos, pois, em bem pensar; eis o princípio da moral."; (Pascal).

A fala evapora, a escrita permanece.

Cuidemos, pois, de "bem pensar" e de "bem expressar" os nossos pensamentos.

Para quem não leu a história, (e poucos leram), faço resumo:

"Certa vez, uma mulher em litígio com outra, (talvez por questão amorosa ou de dinheiro), procurou um bruxo e narrou o seu problema.

O bruxo fez várias perguntas sobre a rival e ela respondeu inclusive que ela detestava gatos.

Então estabeleceu o preço, pediu adiantamento, e disse para a cliente que deveria avisar a outra que ela havia encomendado com ele uma bruxaria e que, a partir de amanhã teria "surpresas" em sua casa.

No dia seguinte a empregada da rival procurou a patroa no quintal, onde tomava um tranqüilo banho de sol, e avisou-a de que havia um gato dormindo na sua cama.

A mulher foi até lá e viu um gatinho preto, filhote mal aberto os olhos, dormindo no imaculado lençol branco.

Arrepiou-se e ordenou à empregada que o jogasse fora.

Na manhã seguinte a mulher ao acordar encontrou dois gatos. Um no corredor e outro sobre a mesa, lambendo seu café-da-manhã.

No terceiro dia três gatinhos.

Um no banheiro, outro trancado em seu guarda-roupa e outro na cristaleira, brincando com os seus cristais.

Doces, mimosos e inofensivos gatinhos.

No quarto, no quinto e no sexto dia encontrou gatos nos mais variados lugares.

No sétimo, tinha gato até na sua geladeira, comendo o pudim reservado para a sobremesa.

Quase louca procurou a rival e acertou a pendência.

A cliente que encomendou a "bruxaria" foi até o bruxo fazer o pagamento final e, como também estava assombrada, desejou saber como fora realizado o "feitiço ou magia".

Segredo de profissão não se revela.

Mas a mulher ofertou quantia irrecusável.

Respondeu-lhe então o bruxo:

____ Metade do que você me pagou antecipado eu dei à empregada para espalhar gatinhos pela casa."

A história tem o propósito de ilustrar como a verdade é simples; que as complicações vêm da mente, distorcida pelos nossos valores, paradigmas, supertições, etc.

Também, para ilustrar que mentir não é tão complicado.

Basta o autor dissimular, alimentar a mente de quem pretende enganar com dúvidas, contar com a sorte e colher no final o objetivo imoral.

Narrada assim é apenas uma história boba e não contêm maldade em si.

O problema é que foi contada em contexto inoportuno.

Ofendeu o direito inalienável da "presunção da inocência", até prova em contrário; e uma das minhas convicções: a de não me manifestar quando minha opinião pode aumentar a dor do outro.

Na vida aprendi que: "Se fazer o bem em nós, estará em nós também o não fazer o mal; ou então, se em nós está o não fazer o bem, estará em nós também fazer o mal. Logo, se de nós depende igualmente fazer o bem e o mal, ou não o fazer (e nisto se diz consistir a bondade e a maldade), de nós depende, o sermos probos ou perversos." (Aristóteles, "A Ética").

Nesta crônica quero partilhar meus pensamentos sobre a Verdade, o Bem e o Mal, da maneira que eu os compreendo.

E também estabelecer as regras da reflexão, as quais dou o nome de: "critério".

A primeira regra é que devo "pensar bem" para conhecer a "Verdade" e dirigir o entendimento para o caminho que a ela conduz.

Conhecer a coisa tal como ela é em si mesma é possuir a "Verdade".

Conhece-la de modo diferente é enganar-se.

As ferramentas para conhecer a Verdade busco nas Virtudes: na boa-fé, na fidelidade, na justiça, no amor ao próximo, na gratidão, no louvor, na felicidade, etc.; em resumo, em todas as coisas boas e dignas que repousam na minha e na alma de todos nós.

As coisas más e indignas deixo de lado, sob pena de cair em erro.

Apresento ao espírito tudo da maneira mais simples, despidas das inutilidades;

depois analiso sobre o prisma das Virtudes: o método facilita a inteligência das coisas e dá a memória a percepção lúcida.

E não esqueço que devemos: "Procurar sempre uma razão verdadeira e necessária... e ouvir a voz da natureza." (Giordano Bruno).

Razão verdadeira e necessária porque é tarefa inútil refletir para não influir no mundo, melhorar nossa postura em face a vida e iluminar nosso semelhante.

E ouvir o nosso espírito, original, profundo, longinqüo, tribal, infinito nos tempos: "a voz da natureza".

Aquele homem que nasceu bom e feliz e se perdeu na desordem dos tempos.

Para resgatar essa nossa divindade, penso que é necessário conhecer para diferenciar o Bem do Mal.

É o que a seguir tento explicar, com o auxílio dos Mestres da Boa Escrita.

O Bem é a "qualidade atribuida a ações e obras humanas que lhes confere um caráter moral", mas é também "felicidade, ventura, favor, benefício, etc.", (Dicionário Aurélio).

O Bem é tudo o que pode ser considerado bom para o espírito humano e que não entra em desacordo com a moral.

Assim, para se estudar o Bem, ( e por conseqüência o Mal), é necessário o estudo da Moral.

Quando se fala em Moral é preciso lembrar que o homem vive em sociedade, que tem exigências que devem ser obedecidas para a convivência social.

Para cumprir essas exigências é indispensável o homem desenvolver virtudes que revelem a supremacia da razão sobre o comportamento: temperamento que não ofenda ao próximo, o autodomínio, o desprendimento, a magnanimidade, etc.

Também compreender que as exigências sociais são classificadas de duas espécies: "as máximas morais" e "as leis morais"; (Marilena Chaui).

As máximas morais são subjetivas: contêm condições consideradas pelo sujeito como válida somente para a sua vontade. Sua finalidade é "educar-se".

Já as leis morais, contêm condições objetivas criadas pelo grupo e que devem ser obedecidas para o bem estar social. Sua finalidade é posicionar-se em face ao grupo social.

Dai decorre afirmar que o moralmente Bom é o que é permissível, licito, honesto, de boa fé, ou, em resumo, tudo o que enobrece o homem e que lhe acrescenta Virtude.

Moralmente Mal é o inverso, é tudo o que ofende o homem e ao seu semelhante na convivência social: o ilicito, o desonesto, o proibido, o ilegítimo, a má-fé, enfim, o que macula e que é Vício, fraqueza da Vontade.

Os atos morais são "Livres", motivo pelo qual a pessoa assume a responsabilidade pela sua prática, e, assim sendo, é causa de mérito ou demérito perante o social e perante ele próprio.

"Se a ação humana não fosse livre, não poderia ser aprovada nem desaprovada; seria simplesmente ação humana e nada mais. Só onde há liberdade é que se pode falar de bem e de mal." (Santo Agostinho).

Conhecendo assim o Bem e o Mal, para fazer suas escolhas o homem é dotado do "Livre Arbítrio".

Se escolhe fazer o Bem é porque optou por agir de acordo com o que classifica de Bom. A opção o exime da "culpa" e o faz "feliz".

Ao reverso, se escolhe fazer o Mal é porque age contra a escolha do que classificou de Bom. Por conseqüência, ofende a sua Razão e sentirá "culpa" e será "infeliz".

A "culpa" nasce da recordação.

Recordação é parte da espiritualidade da alma, alcançada pela atividade de pensar: pesquisar, procurar, conhecer, duvidar, amar o próximo como a si mesmo; etc.

A alma é incorpórea e vive pela atividade de pensar.

De modo que o homem não vive sem o espírito, porque o homem "pensa".

"A alma se relaciona continuamente com a Verdade procurando mostrar que a Verdade está presente na alma; esta presença estabelece a união entre a mente que contempla e a Verdade que é contemplada. Assim, tal união não pode cessar porque nada poderá separar a alma da Verdade; nem o corpo, que é inferior e nada pode contra a alma, nem a própria alma e nem Deus que deu à alma tal natureza e que deseja conservá-la tal como a fez. Assim a Verdade, que está em união com a alma, é imutável e eterna; logo, a alma também é eterna." (Santo Agostinho, baseando-se em Platão).

A Verdade, como a alma, é eterna.

Não tem princípio nem fim, sempre existiu e existirá.

É imutável.

Não se altera com o passar do tempo.

E, jamais fica oculta para sempre.

Resplandecerá um dia.

Esse resultado somente em parte depende de nós.

Temos, pois, a responsabilidade perante o social e perante nós mesmos de fazer a parte que nos cabe, do modo que se nos apresenta.

E aceitar, como São José - cuja data comemoramos no primeiro de maio.

Depois reconhecer nossa humanidade nas Virtudes da Alma.

Por cujos valores éticos estamos ligados uns ao outros de maneira indissolúvel e imutável, desde a explosão da grande nebulosa.

O que faz de nós uma unidade.

Um só corpo.

Tão extremamente único,

que vale afirmar:

"A prece do lavrador é a minha prece;

o crime do criminoso é o meu crime." (*)

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PESQUISA BIBLIOGRÁFICA:

"Questões discutidas sobre a Verdade", Os pensadores, São Paulo, 1985.

"O critério", J. Balmes, Ed. Edições e Publicações Brasil, 1945;

"A Ética", Aristóteles;

"A República", Platão; e,

"A tranqüilidade da vida", Sêneca.

Estes três últimos da "Coleção Mestres Pensadores", brochuras da Editora Escala; R$5,00 cada exemplar na banca.

(*) cito de memória William Saroyan, 1908/1981, escritor americano, com livros publicados no Brasil: "A comédia humana", "Jovem Audaz no Trapézio Voador", "Meu nome é Aram", etc.; e autor da primeira peça encenada pelo TBC - Teatro Brasileiro de Comédia, por profissionais: "Nick Bar, álcool, brinquedos e ambições", (The Time of your Life), com Cacilda Becker e direção de Adolfo Celi. O barzinho "Nick Bar", funcionou durante muitos anos no Bexiga, ao lado do TBC.

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Araçatuba-SP, 03-05-2008

Obrigado pela leitura.