EDUCAÇÃO DOMÉSTICA PARA A DESONESTIDADE E O EGOÍSMO

Certa vez presenciei uma discussão entre um proprietário de uma chácara e uma mãe de uma criança que acabara de furtar uma goiaba. O proprietário alegara a invasão de sua propriedade e o prejuízo do surripio da fruta, a mãe, por outro lado, apontava a mesquinhez do proprietário e invocava o valor irrisório do objeto do furto.

Envergonhado com a argumentação da mãe, o proprietário da chácara deu-se por vencido e deixou de lado a questão. Nunca me esquecerei do sorriso vitorioso da criança ao assistir a argumentação da mãe em sua defesa. A aparente comicidade que reveste tal fato, constitui-se, na verdade, numa tragédia: trata-se de uma flagrante defesa de atitudes egoísticas e de desrespeito ao próximo.

No momento em alguém se apropria de coisa alheia, e que tem pleno conhecimento dessa circunstância, o valor do objeto está relacionado ao ato de apropriar-se dele e ao seu valor de uso: o valor monetário é secundário. Não interessa se se trata de uma goiaba, um aparelho de telefone celular, um carro ou qualquer outra coisa, o surripiador sabe que está se apropriando de algo que não é dele e pouco se importa se está prejudicando alguém ou não; quer apenas levar a vantagem de se apropriar. Portanto, seguindo essa linha de pensamento, quem se apropria de coisa alheia considerada de baixo valor monetário, dependendo da situação, é igualmente capaz de se apropriar de coisas com valor mais alto. Há um trocadilho expresso num ditado popular que evidencia isto: “Quem rouba um milho, rouba um milhão”.

Aquela mãe, ao assumir ostensivamente a defesa do filho que acabara de furtar uma goiaba contra o proprietário da chácara, transmitiu ao filho uma mensagem, de forma indireta, de que se pode apropriar de coisa alheia desde que a considere de pouco valor para quem detém a sua posse. Como considerar o valor do que algo represente para uma outra pessoa é uma operação inteiramente subjetiva, esse processo tende a se desenvolver, inconscientemente, a partir da introjeção de um argumento que é conveniente para minimizar ou excluir o sentimento de culpa de quem está fazendo a consideração.

Todo ato de desonestidade é, sobretudo, um ato de egoísmo. A gênese da prática desses atos, porém, quase sempre está em atitudes e situações vividas e/ou presenciadas na infância e/ou adolescência. A aparente inocuidade do ato camufla o efeito devastador que se produz na personalidade de tal criança ou adolescente e suas inevitáveis manifestações no comportamento do adulto que virá a ser.

Sem a compreensão de que pequenas atitudes, inclusive determinadas brincadeiras, podem ser decisivas na formação da personalidade da criança ou adolescente, muitos pais, transformam os seus filhos em pessoas egoístas e, por conseqüência, desonestas. Muitos desses pais agem bem intencionados, porém, a desinformação, ou negligência, os leva a agir errado. Quantos pais procuram levar alguma vantagem sobre alguém, na presença do próprio filho, sem se dar conta de que, com seu exemplo, está ensinando o filho a ser desonesto? Os exemplos sempre falam mais forte do que as palavras, todavia, na educação de filhos, é comum dar-se mais atenção à fala do que aos atos de quem educa.