A obscuridadre do anonimato (uma reflexão sociológica)
Para muita gente o anonimato é cruel e equivale a um desprezo social. Muitos pagam um preço alto para obter notoriedade diante dos spots da mídia.
A “bola da vez” em termos de notícia é a morte da menina Isabela, filha de Alexandre Nardoni, filho do “seu Antônio”. A outra indiciada Ana Carolina Jatobá era madrasta da menina. Não se pode ligar a tevê que logo aparecem repetidas imagens dessas pessoas, como se só houvesse esse fato lamentável como prioridade de noticia. É assim a mídia: deter audiência, vender jornal, manter-se no topo da informação. Mesmo que tenha que invadir a privacidade das pessoas e tingir de sangue as telas da tevê e as páginas dos jornais. Não vou entrar no mérito da questão nem fazer pre-julgamentos. ou condenaar a priori. A Justiça, e o júri popular, assim espero, vão dizer quem são efetivamente os culpados.
O que quero comentar hoje e aqui é sobre a notoriedade que a mídia deu ao casal envolvido. Ficou-se sabendo muita coisa da vida particular deles. É gozado como a imprensa gosta de esmiuçar fatos, quando se trata de pessoas bem situadas, que moram bem, que têm escolaridade acima da média, ou que são celebridades. Todo mundo sabe a história de Guilherme de Pádua que matou, junto com a mulher, a atriz Daniela Peres. Conhecemos também os detalhes que envolveram a morte da jornalista Beatriz Rodrigues, praticada pelo marido José Sanfelice, que, por sinal está evadido.
Sabemos circunstâncias do crime em que o jornalista Pimenta Neves matou a namorada Sandra Gomide. Os abastados, até na delinqüência obtêm mais notoriedade que a plebe, rude e ignara. Quantas crianças morrem nas vilas e favelas e o fato não ganha a mínima notoriedade da mídia. Se um crime fosse praticado por um “joão ninguém” não tinha manchetes.
Querem ver uma coisa sintomática? Como é o nome do jovem, “serial killer” que matou doze (ou mais) pessoas na região de Novo Hamburgo? Alguém sabe o nome de alguma de suas vítimas? Por que esse desconhecimento? Porque eles, autor e vítimas, são pobres e, como tal, obscuros, condenados ao anonimato. Nessas águas, tivemos o “maníaco do parque”, e tantos outros fautores de crimes hediondos que a gente nem tomou conhecimento dos nome. O crime mais famoso de Porto Alegre, ocorrido em fins do século XIX, é anônimo: quem sabe o nome do “açougueiro da Rua do Arvoredo”?
A obscuridade, oriunda da parte baixa da pirâmide social condena as pessoas a um anonimato, que nem a prática de um crime bárbaro consegue resgatar. No inverso, se o suspeito é de uma classe social que pode gerar dividendos à mídia, ele leva muito tempo para sair das manchetes e das memórias.