A Literatura de auto-ajuda

Fui por muito tempo resistente à leitura de livros sobre auto-ajuda. Minha marcante formação marxista me impedia de levar a sério um punhado de palavras e frases de efeitos que tentam convencer nós simples mortais trabalhadores que o sucesso na vida profissional e pessoal dependente unicamente da nossa força interior.

Acontece que ao desprezar por puro preconceito a literatura de auto-ajuda, estava também cometendo um erro que consistia em não levar em conta que a vida é uma eterna luta dos contrários. Dessa forma, tenho hoje uma impressão diferente desses livros que nos oferecem dicas de como sermos mais felizes.

Em primeiro lugar, não podemos esquecer que picaretagem existe em todo os terrenos da humanidade. É claro que há muito lixo publicado diariamente. Lógico que o mercado editorial tem a noção dos milhões de reais que podem lucrar a custa do “sofrimento” dos outros. Nas livrarias encontra-se tudo quando o assunto é auto-ajuda. De repente fizeram surgir milhares de consultórios psicológicos e psicanalíticos ambulantes em forma de livros. Mas afinal, o que é que podemos ganhar pagando e lendo um livro de auto-ajuda?

Um livro de auto-ajuda deve ser visto com a mesma desconfiança que temos daqueles charlatões que prometem fazer cirurgias sem sujar o paciente de sangue; ou mesmo daqueles bispos que expulsam demônios dos fiéis nos cultos evangélicos transmitidos ao vivo pela TV. Ou seja, não dá pra acreditar numa obra cujo autor garante que um dia após a leitura o leitor estará bem casado e com muito dinheiro na sua conta corrente.

Contudo, não podemos negar que um bom livro de auto-ajuda escrito por alguém reconhecidamente experiente e qualificado, pode ser um instrumento eficiente e capaz de nos motivar a encarar a vida de frente e de forma mais corajosa. No mundo em que vivemos hoje – marcado sobretudo pelo consumismo e individualismo exacerbados – não podemos nos dá o luxo de desprezar algo que possa nos tornar um pouco mais ousado e humano.

Penso que o risco que correm as pessoas que costumam lê um livro de auto-ajuda é transforma-lo no único meio, na única possibilidade de serem felizes. Não podemos perder a noção de que quem faz a nossa história somos nós mesmos, mas não a fazemos como queremos. Somos seres sujeitos as mais diferentes influências. Ninguém pode achar a felicidade tendo apenas o desejo de ser feliz, simplesmente, sem considerar os terríveis obstáculos que a sociedade atual nos impõe.

Não condeno a leitura de auto-ajuda enquanto uma das formas de encontramos forças para continuarmos na luta que a vida impõe. Um livro de Roberto Shiyashik, por exemplo, pode ser lido como se estivéssemos conversando com o nosso melhor amigo, onde esse amigo nos dar conselhos que poderemos seguir ou não. Nem mesmo o maior e mais antigo livro de auto-ajuda do ocidente, a Bíblia, pode nos ajudar sem que façamos a nosso dever do dia-a-dia.

Todavia, penso que o grande mérito da literatura de auto-ajuda é o de chamar a atenção dos leitores para coisas simples, mas que não conseguimos observar quando estamos passando por algum problema profissional ou pessoal. A questão fundamental é ficarmos certos de que livro algum nos fará mais felizes se não lutarmos por um mundo melhor; que não adianta exaltar o “eu posso”, “eu quero”, “eu faço” porque o “eu” não vive só no mundo, pelo contrário: o “eu” necessita dos outros. Enfim, necessitamos tanto de auto-ajuda como de ajudar ao próximo.

Cabe a nós seres humanos críticos e conscientes continuarmos na luta pela construção de um mundo mais humano e mais justo. Se existem livros que podem servir para a grandeza intelectual e espiritual do mundo, então os utilizemos para o bem comum. O que importa é fazermos de tudo que é humano e ético para darmos o salto histórico do ”reino das necessidades para o reino da liberdade”, como dissera o filósofo alemão Frederich Engels.