Haicai, cem anos no Brasil
No dia 18 de junho de 1908 Shuhei Uetska (1876 – 1935) encarregado de conduzir os primeiros imigrantes, pelo hoje histórico navio Kasato Maru, ancorou no porto de Santos. Trazia consigo 793 compatriotas que vinham tentar a vida no Brasil. Ao pisar em terras brasileiras compôs seu famoso haicai.
A nau imigrante
Chegando: vê-se lá no alto
A cascata seca.
(Tradução de Goga)
A primeira publicação de haicai aparece onze anos depois, no livro de Afrânio Peixoto, Trovas Brasileiras (1919). Este livro é considerado o marco inicial do haicai no Brasil.
Em 1926, Wenceslau de Moraes publica o livro “Relance da alma japonesa”. Mas, o primeiro livro, exclusivamente de haicai, foi publicado por Waldomiro Siqueira “Hai-Kais” em 1933.
No mesmo ano, 1933, praticamente desconhecida dos poetas nativos, Nempuku Sato que chegou ao Brasil em 1927, inicia uma coluna de haicai, em japonês, na revista Nôgyô no Buragiru (Brasil Agrícola), que durou até a extinção da revista em 1942, em conseqüência da Segunda Guerra mundial.
Os imigrantes japoneses em terras brasileiras, quase todos se dirigiram para a agricultura, Alguns na condição de colonos, outros de pequenos sitiantes. A presença de um mestre entre eles foi fundamental para o desenvolvimento de um haicai de corte tradicional, vinculado à natureza.
Os estudiosos do haicai brasileiro dizem que Afrânio Peixoto foi um dos primeiros cultivadores dessa poesia e a teria aprendido com autores franceses e não do contato com os imigrantes japoneses. Mas foi Guilherme de Almeida, com seu prestígio de poeta consagrado e a boa qualidade de alguns de seus poemas que o consolidou na literatura brasileira.
Após a guerra, em 1947, Nempuku retoma o contato com os haicaístas e continua ensinando o haicai em revistas e jornais. No Jornal Paulista, Inicia uma nova coluna de haicai. Além dos dois volumes da coletânea de seus haikus, editados em 1953 e 1961, foram publicadas sob sua orientação uma antologia brasileira (1948) e uma antologia paulista (1952). Em 1977 aposenta-se de sua coluna no jornal, após 30 anos ininterruptos. Faleceu a 22 de maio de 1979, aos 81 anos.
Nempuku tinha consciência de sua missão de cultivar o haicai no Brasil e o fez através do ensino itinerante, pela fundação de grêmios de haicai, promoção de concursos, orientação através da imprensa, pela publicação de antologias e de sua própria revista.
A comunidade haicaísta japonesa no Brasil, se organiza em diversos grêmios e publicações em revistas, jornais e antologias. Os filhos e netos dos imigrantes integram-se com facilidade à comunidade brasileira e cresce entre os brasileiros o interesse pelo aprendizado do haicai tradicional.
É famosa a história de que Nempuku imigrou para o Brasil a fim de divulgar o haiku entre os japoneses em sua nova terra, incumbido pelo Mestre Takahama Kyoshi, com quem aprendeu haiku desde a mocidade, quando morava em uma aldeia da província de Niigata, no noroeste do Japão. Ao embarcar, Nempuku recebeu este haiku de despedida:
Cultivando a terra,
Construa uma nação
De haicai.
(Tradução de Goga)
Palavras de H. Masuda Goga:
“O Mestre Nempuku, meu venerável professor, era sério em todos os sentidos. Ele exigia honestidade de si mesmo e também dos discípulos (...). Assim, cumpriu a responsabilidade de pioneiro cultural, ao plantar a pedra fundamental do "Império do Haiku Tradicional".
H. Masuda Goga, após conhecer Nempuku Sato em julho de 1935, passou a enviar seus haikus para serem selecionados pelo mestre e publicados na revista Nôgyô no Buragiru que circulava na colônia japonesa. Como um dos discípulos de maior intimidade e um dos redatores do Jornal Paulista, colaborou para concretizar o sonho sublime do "poeta agricultor". A relação de mestre e discípulo entre Nempuku e Goga foi mantida até o dia da falecimento do mestre.
Resumindo
Shûhei Uetsuka (nome literário Hyôkotsu), o "pai da imigração japonesa", é reconhecido como o autor do primeiro haiku em japonês escrito no Brasil (1908); considerava Nempuku como seu mestre. O mestre Goga idealizador do Grêmio Haicai Ipê tinha como seu mestre, Nempuku Sato. Através do Grêmio Haicai Ipê e sua influência na criação de novos grêmios de haicai, a expansão e divulgação do haicai tradicional no Brasil, completará cem anos em 18 de junho de 2008.
Informações pesquisadas nos textos de Mestre Goga
Fonte: www.kakinet.com
Praia do Anil, Magé – RJ, 03.04.08
Benedita Azevedo