DESROTULANDO…
Quando criança, minha mãe me mandava ir à mercearia para comprar Bombril. E chegando ao local de destino, apenas lia o nome e levava sem demora.
Porém, houve dias em que ela mandava comprar e não encontrava o Bombril.
Então, ouvia-lhe dizer: “Se não tem Bombril, compre qualquer um outro.”
Eu voltava e trazia qualquer marca, crendo que se tratava do mesmo Bombril.
É engraçado que, somente depois de crescido, fiquei sabendo que Bombril era, na verdade, uma marca de esponja de aço e não o produto em si.
Em minha mente, por bastante tempo, a marca e o produto eram o mesmo.
Todavia, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, já bem falava a sabedoria popular.
Essa forma de compreensão rotular, descrita acima, não é somente uma simples ignorância, mas se apresenta, também, como um olhar da vida, estando presente em todas as esferas do cotidiano.
Fácil e displicentemente se rotula algo ou alguém.
Se for pastor, logo, é ladrão.
Se for leitor da Bíblia, logo, é evangélico.
Se for padre, logo, é pedófilo.
Se gostar das cores vermelho e preto, logo, é torcedor do Flamengo ou do Sport Club do Recife (os que me lembro).
Se for baiano, logo, é preguiçoso.
Se for nordestino, logo, é sub-raça.
Se for sulista, logo, é ambicioso.
Se for árabe, logo, é terrorista.
Se for americano, logo, é super-herói.
Se for loira, logo, não tem neurônios.
Se for bonitinha, logo, é ordinária.
Se for mal-humorado quando acorda, logo, é chato o dia inteiro.
Se possuir tatuagem, logo, é malandro.
E por aí vai… e não pára. Tal lista é interminável.
Mediante à rotulagem, preconceito, bullying, manipulação, indiferença, desdém, inveja, difamação, ódio, etc., se disfarçam.
E nessa dinâmica…
Todos se tornam iguais-diferentes.
Todos se tornam diferentes-iguais.
Todos se tornam desprezíveis.
Todos se tornam louváveis.
Todos se tornam convenientes.
Enfim, todos se tornam a nossa cara e o avesso dela.
Sei que não deixarei de ser rotulado por pensar assim.
Contudo, meu interesse, é chamar-lhe a atenção para ver que há uma dimensão de benesses nas peculiaridades de cada indivíduo, pois, nelas, residem o valor de cada ser e o potencial de alterar a realidade.
São encontradas nas peculiaridades de cada ser a importância de existir de cada um e a soma que constroem o novo.
Tem-se dito que o culto às similaridades é o caminho da edificação de uma humanidade mais humana.
A experiência nos mostra que não.
Por isso, proponho o respeito ao ser humano como o início da trilha de um amanhecer de vitórias para todos.
Quem continua habitando no mundo das imagens jamais entenderá que, desaparecendo a marca Bombril, ainda continuará a existir a esponja de aço.
Entretanto, para a dona de casa que esfrega a panela, no intuito de deixá-la brilhando, a marca da esponja de aço não lhe fará a menor falta.
Edson Rodrigues,
03/04/08,
Recife/PE.