Paradoxo do esporte
Tomando como base uma escala de 0 a 100, a seleção do Brasil, entre 1960 e 1990 provavelmente flutuava entre os níveis 90 e 95 (a perfeição, só no Céu). Seus adversários mais próximos, não passavam de 90 mesmo no auge. E as seleções dos grupos inferiores, esporadicamente alcançavam 70. Por isto aplicávamos sonoras goleadas e nossa camisa amarela era temida e respeitada. Os adversários se contentavam em perder de 2 x 0 e comemoravam um empate com enorme entusiasmo.
O tempo passou, os aprendizes se estruturaram, importaram nossos profissionais e atletas, pagaram caro, absorveram muitos de nossos segredos e criaram algumas armadilhas para nossos vaidosos jogadores. E aqui, na terra onde o governo não cumpria suas obrigações sociais, a imprensa domesticada era induzida a glorificar atletas botinudos para distrair o povo dos verdadeiros problemas nacionais e para valorizar a "mercadoria" de empresários vorazes. Juntaram-se a estes, políticos inescrupulosos preocupados em adquirir votos através de apoio demagógico ao futebol. Com isto, a corrupção atingiu o esporte no coração. Vários escândalos surgiram sem pudor: criação de ligas fantasmas, papeletas amarelas (Flamengo), acordo de resultados nas categorias profissional e aspirante (Vasco e Olaria) e bicheiros no comando (Botafogo e Fluminense). Despontaram dirigentes que mancharam a dignidade do futebol: Oinareves, Chedid, "caixa de água poluída", Eurico Miranda e Ricardo Teixeira. A CPI do futebol acabou em pizza (colocaram capim na mesma, como previ a mais de OITO anos em outro artigo).
Hoje em dia o futebol é apenas mais um negócio, onde as mutretas (copiadas da administração pública) abundam sem cerimônia. Nossos atuais jogadores, já estabilizados na vida, talvez por terem origem humilde, trazem na alma alguma ponta de civismo revoltado com as freqüentes tentativas do governo em usar o esporte como capa para esconder o caos social que massacra o povo sofrido. Inconscientemente colocam seu prestígio em risco para nos ajudar a tirar a população da hipnose que nos anestesia em maior dose nos últimos vinte anos. Apesar da tristeza pelos resultados, agradecemos a eles esta falta de empenho em vencer, para não ajudar a mascarar nosso estado de miséria. E ergueremos uma estátua a eles se não forem coniventes com os abutres que dirigem nossos destinos. É um paradoxo que lhes traz algum sofrimento, como a nós por termos como opção votar NULO.
Haroldo P. Barboza – Matemático, Analista de computador e Poeta
Autor do livro: Brinque e cresça feliz