O importante mesmo é parecer
É gozado como cada categoria tem sua linguagem própria. Já estiveram, por exemplo, num almoço de economistas ? A gente come deflação, bebe taxa CDI recebe por sobremesa uma base monetária e ainda tem, no café, uma tributação direta.
Em reunião de judocas, quem não é iniciado fica sem pai nem mãe. “Ai puxei ele e dei um taiotoshi de esquerda, o cara caiu de wazaari mas consegui pegar ele na quarta imobilização...”
Assim também é nas rodas de surfistas, grupo aliás em moda lá em casa. Eles falam uma linguagem que parece que se aterrissou em outro planeta: “Entrei na água e comecei a remar... a bruta levantou e eu fiquei com medo de ser chupado pelo canal, aí fiz um slalon para a esquerda, dropei a onda e vim sair num tubo esperto... na chegada quase que a rabeta da quilha dá numa pedra...”.
Pois essa história dos surfistas é curiosa. Nem todos têm a técnica e a coragem suficientes para entrarem lá dentro e pegar um tubo. Isso, de certa forma é irrelevante. Vale mais parecer surfista.
Perguntei a um desses, porque ele não deixava a prancha na praia ao invés de viajar com ela, sobre o rack do carro, semanalmente, para a cidade, onde não tem mar, o rapaz respondeu entre grunhidos e monossílabos.
Depois refleti: eles querem ter o status, passar pelos outros carros, com as pranchas esvoaçando na capota do automóvel, na esperança que alguém pense (de preferência uma garota): “Oh! ali vai um surfista!”
Na praia é a mesma coisa. Eles andam daqui para lá, de lá para cá, com a prancha debaixo do braço, a corda aquela no tornozelo, cabelos esvoaçantes, tatuagem no braço, barba de UTI, pulseirinha hippye no pulso. Tenho um amigo, mestre dos gozadores, que ao ver os filhos desfilar a praia toda, de prancha debaixo do braço, diz que eles não são surfistas, mas sovaquistas.
O surfista é um radical. Ele não pratica outro esporte. Só lê revistas do ramo e escuta “rock pauleira”. São tão radicais que - e essa eu vi - si tiver numa capa de revista, uma grande bunda feminina, e num canto da página, uma praia, eles olham a praia e desprezam o resto.
O importante nem é o mar, mas fazer onda, para que as menininhas reconheçam neles uns surfistas intrépidos. À noite, então, seja no Rosa ou na Ferrugem, apoiados pela bebedeira de duas latinhas de cerveja ou uma caipirinha de coco, eles destravam a língua, contando histórias imaginárias, de tubos enormes que pegaram em Waikiki, ou em Sun-house, na Nova Zelândia, no Siriú ou na Ribanceira.
O que importa é impressionar as meninas, atrair ouvintes e contar proezas semelhantes às dos radicais californianos. E assim, entre uma onda, uma abobrinha e um sonho, a garotada vai vivendo, se divertindo e se preparando, com boa cabeça, para o futuro.É quando despertam a tempo, sabendo ditinguir o que é devaneio e o que é realidade
(Garopaba, em verão desses)