A história do guarda-sol
Têm certas tolices que nem se deveria contar, pois o fato de tornar públicas nossas mancadas denigre a boa impressão que algumas poucas e gentis pessoas fazem da gente.
Mas, primeiro porque sou sincero, e depois porque em época de veraneio meio que faltam os assuntos, decidi passar a meus leitores mais uma desventura de um veranista. Como aposentado e descompromissado, gosto de passar um mês, 40 dias da praia.
Lá pelas oito e meia da manhã cravo o guarda sol e instalo as cadeirinhas, só desarmando o circo lá pelas seis da tarde. E tome chuva, vento, areia, onda e encontrão...
Um guarda-sol não dura três veraneios. Há dois anos comprei um, muito bonito, com aqueles motivos praianos babacas. Era uma guarda-sol forte, mas tinha um defeito: o pau era metálico; não durou muito. A lona permaneceu em bom estado, mas sem pau não dá para se fazer nada... Resultado: tive que comprar outro.
Gentilmente, a sogra se prontificou a dar um, de presente. Para deixar livre a escolha, deu o dinheiro para a compra. Aí, minha mulher que não entende nada de guarda-sol, disse: “Porque não compras logo um ? Nas lojas tal e tal, têm uns bem bonitos, resistentes e baratos... Podes comprar em Canoas ou em Porto Alegre... na praia é muito caro...”.
E eu fiquei pensando: “Quem sempre compra o guarda-sol sou eu; keki ela entende do assunto?”. E não comprei. Quando chegamos à praia, a primeira (das tantas) cobranças da tribo foi: “Kadê o guarda-sol ?”.
Logo na primeira manhã, ao invés de desfrutar os bônus, couberam-me os ônus da compra. E aquele comércio de Garopaba está uma exploração danada. Andei de loja em loja. Os guarda-sóis, além de feios, medonhos, eram caros, quase o dobro do que Carmen encontrara em Canoas. E agora - pensei - como é que vai ser? Não posso dar o braço a torcer. Fiquei firme e continuei minha pesquisa no comércio.
Era quase meio dia e eu não tinha encontrado uma mercadoria que me satisfizesse, em qualidade, beleza e preço. E já estava me maldizendo: “Por que não comprei essa porcaria em Canoas ?” De repente vi algo. Uma senhora saia de uma lojinha com um vistoso guarda-sol. “É esse, pensei, vou comprá-lo, pra ver ser aquelas malas lá de casa sossegam”.
Entrei na loja. Era um cubículo, escuro, apertado, cheio de gente, com um cheiro de rabo mal lavado... Gente tinha pouco; turistas, demais. O atendimento foi demorado..
Quando a balconista veio me atender, e fiz-lhe a solicitação, ela disse que não tinha mais, que haviam sido todos vendidos. Quase me deu uma apoplexia. Olhei ao redor e, lá no chão, de lado, havia um.
“E aquele ? perguntei”. “Aquele ixtá reservado...” disse a moça em carregado sotaque açoriano. Depois que insisti, ele acabou me vendendo o colorido guarda-sol. O preço era o dobro do que eu havia visto em Porto Alegre. “Paciência, é o preço da imprevidência...”.
Quando abri o instrumento, vi uma etiqueta. Algo me dizia para não lê-la. Sucumbi à curiosidade: “Fábrica Estrela de Artigos de Praia - Made in Brazil - Rua Siqueira Campos, número tal... Canoas, RS”. A fábrica ficava a duas quadras de minha casa
Garopaba, fevereiro de 1993