A Diversidade Sociocultural e a Prática Pedagógica (Estudo da realidade em algumas escolas baianas)

A educação como instrumento elementar de construção de novos paradigmas, adota através dos órgãos oficiais, políticas de inclusão escolar, respeito às diversidades, pedagogias de combate ao racismo e igualdade social.

Os direitos culturais fazem parte dos Direitos Humanos, e a legislação brasileira garante educação gratuita e de qualidade para todos.

A Constituição Brasileira de 1988, no artigo 205, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, (9391/96), garantem a todos os brasileiros, sem distinção de cor, sexo, credo, cultura, condição social, política e econômica, direitos iguais perante a lei, para pleno desenvolvimento da cidadania, quer seja no campo pessoal ou profissional. E, sendo a educação o meio que permeia esse processo de direitos constituídos para a construção de uma sociedade igualitária, plural e sem preconceitos, ainda assim, vemos acontecer no nosso dia-a-dia de profissional em educação, o racismo sendo exaltado e o respeito às diferenças não valorizado.

Para Gadotti (1992), equidade em educação significa igualdade de oportunidade para todos poderem desenvolver suas potencialidades.

O preconceito social e cultural em suas diversas manifestações é uma realidade em nossa sociedade. E, ser diferente em qualquer aspecto, rotula o indivíduo e o conduz, muitas vezes, ao ridículo perante aos outros componentes do grupo. Gadotti afirma ainda que, a diversidade é a riqueza da humanidade (...) por isso, a escola tem que ser local como ponto de partida, mas tem que ser internacional como ponto de chegada; assim, como a equidade só pode ser atingida quando as classes populares entrarem e permanecerem numa escola que lhes interesse.

Nas escolas rurais, o alunado é composto basicamente de pessoas que pertencem à classe mais pobre da população baiana, enquanto que na zona urbana, ao contrário, a realidade é um tanto melhor, embora nas periferias ainda se perceba casos de má qualidade do ensino, por questões de espaço físico mal estruturado e educadores sem preparo pedagógico, com exceções, é claro. São realidades distintas, portanto. Tomaremos como base para essa análise duas práticas pedagógicas e /ou educativas antagônicas, citadas por Paulo Freire (1982) - a bancária que tornam os educandos sujeitos passivos e mistifica a realidade e a prática problematizadora que se alicerça e implica na ação e reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Constatamos as duas práticas sendo utilizadas em nossas escolas por nossos docentes, muitas vezes, simultaneamente.

Fundamenta-se também esse estudo na afirmação de Freire (1996) ao dizer que, ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural, e de Perrenoud (2000) ao afirmar existir em cada classe uma significativa parcela de diferenciação que ele denomina de selvagem e da qual os professores têm uma vaga consciência e a qual não dominam.

Dentro do contexto problemático e inquietante, o qual originou essas reflexões, se inserem nas salas de aulas heterogêneas, apertadas e com mais de quarenta alunos agrupados. Na maioria das escolas,os alunos sentam um atrás do outro, em filas, sendo esse, um desafio contínuo para os docentes de maneira geral, realizar as atividades educativas com vistas, ao estudo, construção e reconstrução do conhecimento.

Perrenoud ao se referir às diferenças, afirma também que elas fazem parte da vida, nada podendo funcionar sem elas, as quais ocorrem em parte em nível inconsciente, ao sabor das circunstâncias, de maneira automática, e mais, (...) essa forma de diferenciação voluntária, tange simultaneamente às relações entre sujeitos singulares e, através deles às relações entre as culturas em que se inserem. Assim, a consciência dentro desse patamar nasce das pressões, das personalidades, das situações e da cultura em jogo, do fato de que em nenhuma interação social, podem-se tratar os interlocutores exatamente da mesma maneira.

As questões sociais costumeiramente são motivos de exclusão, discriminação e desigualdade. Os alunos de escolas públicas, geralmente são estigmatizados de pobres, cujos pais, possuem baixo poder aquisitivo. Ocorre, no entanto, em muitas instituições escolares, transferências de estudantes oriundos das escolas da rede particular, para a rede pública por vários motivos, os mais comuns são: a discriminação por parte dos colegas pelo pouco rendimento na aprendizagem, complexo de inferioridade, indisciplina, receio de serem reprovados e outros fatores. Chegam em todos os períodos do ano letivo, às vezes, na terceira e até em alguns casos, na quarta unidade.

Vale ressaltar que o valor da média é 5 (cinco) para as escolas estaduais, facilitando assim, para o aluno recém-chegado da escola particular, a recuperação das disciplinas perdidas, sem muito esforço, já que nas escolas de onde vieram em geral, a média é 7 (sete). Estabelece-se aí um conflito social. As relações interpessoais entre os alunos e professores com a entrada de novos membros de uma outra camada social, implica numa série de fatos novos, que fatalmente irão refletir na prática pedagógica docente e nas relações interpessoais entre os alunos.

Vivemos em uma sociedade composta de classes sociais altamente desiguais e a educação,na visão de Freire, é o mecanismo necessário para a superação dessas desigualdades. No entanto, nem sempre a educação cumpre esse papel. Sendo assim, essa análise pretende identificar as dificuldades da ação pedagógica no ensino formal, sistematizado, hierarquizado e todo o processo que resulta na inclusão e exclusão escolar, tendo como indicativos as desigualdades socioculturais.

A importância deste estudo reflexivo no âmbito acadêmico é também proporcionar a priori, o repensar da prática pedagógica em realidades distintas. Proporcionar através da reflexão, possíveis mudanças na metodologia aplicada em sala de aula, novos paradigmas, novas leituras de mundo, maior necessidade de estudo e revisão do trabalho pedagógico até então realizado etc.

Luckesi (2003) acusa o próprio sistema de ensino - com base em estatísticas e dados educacionais - de não estar comprometido com o desenvolvimento dos educandos, tomados sob o ponto de vista da coletividade. Sabendo-se que, tanto do ponto de vista do sistema educativo (governos federal, estadual e municipal) quanto do educador é preciso estar interessado em que o educando aprenda e se desenvolva individual e coletivamente.Segundo ele, os dados estatísticos educacionais do país bem como a conduta individual dos professores demonstra que, nem sempre, esse objetivo tem sido perseguido.

Dentro do contexto de sociedade, o estudo da estrutura sociocultural de duas realidades peculiares e desiguais, demonstrará de que forma o conhecimento vem sendo construído e assimilado, visto que os livros didáticos para as duas zonas (rural e urbana) são similares. Assim sendo, fica a cargo da educação a responsabilidade de definir metas, planejamentos, projetos e planos de ação e outros indicadores que possibilite dentro dessa sociedade plural, composta por culturas e características singulares, o cumprimento das leis e o exercício da cidadania, utilizando como instrumento a prática pedagógica.

É importante ressaltar, que a cultura aqui é entendida através do pensamento de Santos (1994) (...) diz respeito à humanidade como um todo e ao mesmo tempo a cada um dos povos, nações sociedade e grupos humanos.

Em muitas escolas falta à presença do coordenador pedagógico e a didática e demais habilidades e competências para a construção e reconstrução do conhecimento na comunidade escolar, fica a critério unicamente dos docentes.

Portanto, procuramos compreender os caminhos pelos quais perpassam os educadores e educandos e consequentemente toda a comunidade escolar, ao por em prática as determinações contidas nas Leis que garantem os direitos a todos os cidadãos de serem iguais e terem acesso ao conhecimento cientifico. Assim, como a complexidade em pedagogicamente trabalhar com a diversidade cultural e social, em regiões onde predominam na educação um sistema tradicionalista. sistema esse, relativamente agregado a grupos políticos autoritários, que demonstram, através de seus atos, conceber a educação como um mecanismo de dominação, alienação e poder.

Logo, a justificativa maior que alicerça esse estudo teórico e empírico está calçado na vida prática de muitos professores baianos das escolas estaduais que lecionam em regime de quarenta horas semanais com quatorze turmas heterogêneas em escolas sem coordenação pedagógica e com até cinco disciplinas para quatro delas o professor não possui formação acadêmica específica. E, geralmente (com raras exceções) as outras quatro disciplinas são impostas pela instituição escolar, causando aos professores habilitados na área de humanas, pânico e insegurança por não dominarem os conteúdos programáticos, tendo às vezes, que pagar um curso particular, quando lhes entregam disciplinas na área de exatas para complementação da carga horária e vice-verso.

A prática pedagógica desses docentes diante desse panorama que se apresenta, somados a necessidade de se promoverem dentro das unidades escolares, requer por parte do poder público, políticas de respeito às diversidades e demais adequações, resultantes do processo de resignificação de conteúdos e de valores; estudo e investigação criteriosa de como se processa na prática, esse dinamismo, aliado às mudanças ocorridas na sociedade nas últimas décadas a partir da introdução das novas tecnologias.

Na zona urbana a divisão de classes sociais é muito grande e a cultura de cada grupo social é desigual, vivendo esses grupos em conflitos constantes. Ao contrário das escolas da zona rural onde a população pertence a maioria - a uma única classe social.

Sendo assim, fica evidente, que o trabalho educativo necessita ser mais criterioso e que o respeito e o cumprimento das determinações legais devam ser de fato,cumpridos para que se efetive na prática a melhoria da qualidade do ensino em muitas das nossas escolas baianas.

Referências

GADOTTI, Moacir.Pedagogia da Práxis.São Paulo,

Cortez, Suny. 1994.

GADOTTI, Moacir. A educação e o município: sua nova organização. Brasília: MEC, 1993.

GADOTTI, Moacir.Educação e poder.São Paulo.Cortez, 1985.

GADOTTI, Moacir. Diversidade cultural e educação para todos. São Paulo, ed.Graal,1992.

FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir. 12ª edição, brasiliense, 1991.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 11ª edição, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29ª edição, São Paulo, Paz e Terra, 1996.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 15ª edição, São Paulo, Cortez, 2003.

SANTOS, José Luis dos.O que é cultura. 14ª edição, São Paulo, Brasiliense, 1994.

TORRES GONZALÉS, José Antonio. Educação e diversidade: bases didáticas e organizativas. Porto Alegre, Artmed, 2002.

PERRENOUD, Phillippe. Pedagogia diferenciada das intenções a ação.Trad. Patrícia Chittoni Ramos, Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

VEIGA, Ilma Passos Alencastro. A prática pedagógica do professor de didática. 8ª edição, Campinas, Papirus, 2004.