Quando nasce o segundo filho.
O casal estava grávido de 6 meses, muito amor e alegria na chegada do segundo filho. E em meio à preparação do enxoval os pais conversavam com o primogênito Marquinhos de 4 anos, a fim de deixá-lo ciente de que novo integrante iria se incorporar a família. No entanto, não obstante ao esforço dos pais para que o nascimento do segundo filho fosse algo natural para Marquinhos, os parentes mais próximos trocavam os pés pelas mãos e advertiam-no com frases do tipo:
- Ah, Marquinhos, agora você vai perder o trono!
- Coitado, terá que aprender a dividir com o irmão!
Marquinhos, inteligente como ele só, ao ouvir essas frases entendia que o novo irmão viria para lhe tomar o lugar no coração dos pais. Estava então estabelecida a competição predatória na vida de Marquinhos.
O garoto cresceu assustado com as pessoas novas. Na escola quando algum aluno novo fazia amizade com um de seus amigos prediletos ele sentia-se ameaçado de perder o carinho e a amizade.
No ambiente profissional também era assim, quando novas contratações eram feitas Marquinhos sentia-se incomodado. Com isso seu circulo de amizades era restrito e seu desempenho comprometido, Marquinhos jamais se esquecera das frases da infância:
- Vai perder o trono!
- Terá que aprender a dividir!
Resolvi escrever sobre isso porque há algum tempo presenciei fato semelhante. Os parentes, a semelhança da história acima, assustavam a criança com essa tortura psicológica, e sequer notavam dos malefícios que frases desse quilate causam à alma infantil, que precisa acima de qualquer coisa de segurança para se desenvolver em plenitude.
Eu mesmo me lembro que ganhei presentes de alguns amigos de meus pais quando meu irmão nasceu, há 29 anos. Queriam ser gentis, no entanto, não sai de minha mente a fisionomia de pesar com que me fitavam, parecia mesmo que eu havia perdido algo. Hoje é fácil entender, os amigos julgavam-me um pobre coitado, que dali em diante iria dividir a atenção dos pais. Meu irmão nunca me tirou nada, ao contrário, é e sempre foi meu melhor amigo, o melhor presente que pude ganhar de meus pais.
Infelizmente a competição predatória começa a ser alimentada na família pelos pais ou parentes próximos. Primos que competem pela melhor nota, irmãos que são rivais na luta pelo amor paterno ou materno, cônjuges que disputam acirradamente uma melhor colocação profissional.
Julgam o próximo mais próximo um oponente, um rival, um jogador...
Não aprenderam a dividir no seio familiar porque nada lhes foi ensinado a esse respeito. Quando um novo irmão nascia, as frases eram de caráter negativo incitando a competição com o outro.
E a sociedade é que acaba arcando com o ônus e recebendo em seu seio indivíduos assustados, desconfiados, competidores contumazes que nada sabem dividir e querem exclusividade em tudo.
Mais prudente pais e parentes se atentarem para o que dizem aos seus pequenos quando novos integrantes irão se incorporar a família. Muito melhor mostrar que o irmão ou irmã ou mesmo o primo que vai nascer vem para somar, agregar, melhorar.
Frases do tipo: “Veja, você vai ganhar um irmão e um novo amigo pra brincar!” e “Agora terá companhia para dormir!”, são músicas de harmonia que mostram à criança que nada há a temer, que novas pessoas entram em nossa vida para enriquecer, jamais empobrecer. O mundo será melhor quando vermos o outro como irmão, como companheiro, como um tesouro que nos premia com a pérola inestimável de sua presença em nossa vida.
Pensemos nisso.