A Tríplice Missão
O que acontece nos relacionamentos interpessoais mais próximos é o encontro dos “Eus” verdadeiros. Sempre estamos lembrando que as nossas atitudes revelam quem somos mas tais atitudes são mais explícitas na nossa intimidade. Outro dia no treinamento de líderes da escola que temos em nossa igreja o ministrante alertou: Somos o que realmente somos quando estamos sozinhos. E eu completaria dizendo que expressamos muito mais daquilo que somos nos relacionamentos mais próximos e íntimos. Digo isto porque socialmente nos mascaramos num “carnaval existencial”, na proteção da nossa real identidade. Mas a intimidade e a proximidade nos deixam transparentes, guardadas as devidas proporções dos cuidados que despendemos para esconder o nosso verdadeiro eu.
Porque nos escondemos atrás de máscaras existenciais e sociais? Porque temos o medo de ser rejeitados, escorraçados, julgados, questionados e “objetizados” neste processo. Seria como se estivéssemos pensando que os outros, ao descobrir as nossas debilidades e fragilidades, teriam contra nós armas potencialmente destrutivas. E assim como Adão, ao pecar, se escondeu entre as àrvores do jardim, fazemos o mesmo. Talvez, simplesmente não tenhamos a coragem de expor os motivos de nossa atitude fugidia. Adão pelo menos se expressou, verbalizou o seu medo: “ Estava nu, tive medo e me escondi...”.
Eu e você, todos nós, temos fragilidades e isto não é vergonha nenhuma. Vivemos entre a tensão de ser o que realmente somos e parecer ser o que ainda não somos. Em vez de focarmos na nossa dignidade, focamos na nossa reputação, na preocupação de sermos aceitos pelos outros. A solução para Adão foi a abertura do seu coração para Deus, ao ponto de dizer o que realmente estava acontecendo, então Deus pôde vesti-lo. Quem sabe precisemos seguir o mesmo caminho, o que nos desestressaria mais e aliviaria os nossos lares. Somos tão gentis fora das nossas casas, e tão embrutecidos nos nossos relacionamentos mais íntimos, mais próximos. E somos assim neste ambiente porque as máscaras ali caíram faz tempo.
Conta-se certa vez quem um pastor estava dirigindo um culto na igreja em que servia, e naquele dia, durante o culto, alguém estacionou um caminhão na frente do templo, e então começaram a descarregar alguns móveis para dentro do templo, diga-se de passagem, bem parecidos com os seus. E de fato eram os seus, tendo em vista que a sua esposa chegara junto com o caminhão e dissera aonde colocá-los. Perplexo e meio sem chão, o reverendo diz para a mulher: “-O que é isto? Porque está fazendo assim?” Ela ironicamente o responde: “-É que aqui na igreja você é tão gentil, tão amável, tão especial com as pessoas que eu resolvi morar na igreja. O pastor que vai para casa depois do culto não parece ser você.” Logicamente nos parece uma estória, mas pode ser que esteja aproximada da realidade de alguns, religiosos ou não, ministros ou não. E que pena que seja assim, porque o maior testemunho de Deus não está nas palavras e sim na vida.
Na realidade estamos profundamente compromissados com o que somos fora das nossas casas, quando dentro dos nossos corações precisaríamos cuidar com o que somos, verdadeiramente, com o que externamos em nossos relacionamentos mais íntimos e próximos e com o que os outros de fora sabem que nós somos.
Uma boa ajuda seria decidir para quem vamos ser o que realmente somos, porque assim poderíamos corrigir os rumos de nossas vidas. Ser para Deus, para nós e para os outros é a missão tríplice da vida.