Aux armes citoyens!
“Aux armes, citoyens!”
Sob este brado guerreiro, os franceses incitavam seus concidadãos a se livrarem, do jugo da monarquia, em busca da liberté, égalité e fraternité, divisas clássicas da Revolução Francesa, e posteriormente copiadas para a bandeira do Rio Grande. A convocação “aux armes citoyens” (às armas, cidadãos!) era uma divisa de exasperação de um povo que não podia suportar mais tanta opressão de uma corte insensível. Maria Antonieta mandou os famintos, sem pão, comerem brioches. Recordam?
Pois o Brasil está mais ou menos assim, hoje em dia. E o Rio Grande, fiel à corte, não está muito longe daquele nefasto modelo. E volto a falar nos 253 milhões com que o Governo do Estado “brindou” a GM. São Paulo, um estado mais rico que o nosso, dá incentivos de até 25 milhões. Nós, mais descapitalizados, damos dez vezes mais e com dez anos para pagar, cinco de carência e juros de 6% ao ano. E isso é dinheiro público, resultante de parte da entrega da CRT à iniciativa privada. Já imaginaram se o governo investisse os milhões que tem, na agricultura, e em especial na produção de alimentos? Será que o setor do arroz, do trigo, dos suínos e das leguminosas sonhou alguma vez em juros de 6% ao ano, prazo generoso e carência?
Não será por causa da falta desses recursos que há tanta quebradeira e desestímulo? Não estará nessa insensibilidade a causa da evasão de agricultores para o Paraná e Mato Grosso, e indústrias para o nordeste? Assisti, há dias, na tevê, “Os Miseráveis” de Victor Hugo. Na miséria do povo pegando em armas e na letra da Marselhesa, lembrei-me do Rio Grande. Como cristão e adepto da não-violência, sou a favor da paz, desde que essa seja mais ou menos honrosa. As armas de hoje, não carece serem as da violência, embora os governos agridam o povo com a violência de suas medidas. O “aux armes citoyens” não precisa, necessariamente, ser o pegar um fuzil, uma espada ou um machado. Nossas armas podem ser mais eficazes, se forem bem usadas.
O bom senso afirma, e a história confirma que, nas revoluções sangrentas, aquele que toma o poder pela força, torna-se mais violento que o tirano derrubado. Embora meio claudicante, nós temos a democracia. Ela nos mostra as armas, pelas quais o cidadão pode fazer a depuração, como no caso em questão. A primeira e a melhor arma é o voto bem dirigido, capaz de sufragar representantes ativos, e não falastrões comprometidos. Em paralelo vem a vigilância social, através da mídia isenta, e dos meios que a sociedade dispõe, como sindicatos, associações, etc. E, por último, medidas judiciais eficazes e tempestivas, capazes de sustar a dilapidação ou mau uso do dinheiro público. Os órgãos classistas do meio rural, já que o arroz é mais estratégico que carros zero (GM), refrigerantes (Coca Cola), computadores (Dell) e cigarros (Souza Cruz, ramos generosamente agraciados pelo Governo do Estado, podem obter, via justiça, uma analogia de prazos e taxas conferidos à montadora. “Aux armes, citoyens!”.
Este artigo foi publicado há mais de dez anos. Algo mudou? De lá para cá os Governos Estaduais afundaram o Rio Grande, cada vez mais.
Crônica publicada em 26/04/97 no Diário Popular de Pelotas