O significado do carnaval
O carnaval é uma enorme metáfora. E possui dialeto próprio contagiante. A tribo inicial incha e sob proporções dilatadas desfila triunfante sob paetês, lantejoulas, plumas, penas, e toda sorte de fantasia.
O operário durante o carnaval se traveste em rei, príncipe ou nobre importante. O empresário se traveste de malandro, mafioso ou sambista. E, todos trocam de papéis numa subversão consentida.
O mesmo operário vai ser o entretenimento dos camarotes, arquibancadas e terá sua fama e apelidos por todos conhecidos. As baterias das escolas de samba esquadrinham novas batidas, novas paradas, novos ritmos remodelando os samba-enredo, redesenhando a dança das mulatas, das passistas e dos espectadores. Que de tão expectante vibram a cada grito de guerra das escolas.
Os mestres das baterias verdadeiros maestros da percussão, alias conheci um pessoalmente que me assombrou pelo intenso conhecimento musical intuitivo. Salve ! Evoé! Mestre Jorjão.
Mas a metáfora do carnaval nos remete a reflexão sobre a preciosa expressão cultural e popular de um povo. De sua identidade cultural. Na redenção e catarse que significa aqueles parcos dias de folia. Na crítica satírica da realidade social e na inércia do poder constituído ante as agruras sofridas cotidianamente por um povo.
O submundo do carnaval abrigado nos barracões e, na terra do samba que efetivamente emprega grossos números de trabalhadores, num mercado absurdamente informal e injusto. Sem reconhecimento de vínculo laboral, sem remuneração de horas extraordinárias e nem recebimento de verbas rescisórias diante da demissão injustificada.
E os trabalhadores prejudicados sob o temor do poder inquestionável dos cappos, do submundo marginal, muitos deles sucumbem em silêncio perdendo seus direitos trabalhistas, sem sequer, ajuizar reclamação trabalhista.
Nas várias versões sobre a etimologia da palavra carnaval, tem que indique no dialeto milanês “carnavale” que significa: “o tempo em que se tira o uso da carne”. Os mais famosos carnavais são realizados em Veneza, Nice, Florença, Nápoles, Olinda, Salvador e Rio de Janeiro.
O carnaval desde sua origem romana (saturnálais) acontecia uma aparente quebra de hierarquia social, onde os escravos, soldados, filósofos, tribunos e patrícios se misturavam na festa em plena praça pública.
No Brasil um memorável carnaval foi o de 1888, ano da abolição dos escravos que despontou no Rio de Janeiro, lá perto da Cruz Vermelha. O carnaval antes uma festa de rua, se tornou o maior show da terra, e passou a ser uma autêntica liberação das privações da quaresma, tanto que alguns estudiosos alegam que o vocábulo carnaval vem do latim carnem levare que significa a abstenção da carne.
Nos paradoxos do carnaval onde existe a rainha da bateria que não sabe sambar, onde os puxadores empurram no muque ao longo sambódromo imensos carros alegóricos, e eles quebram no meio do caminho. E os destaques que deveriam desfilar nas alturas, seguem à pé, com o samba no pé, miudinho, sob pesadas fantasias, cantando alto a letra do samba-enredo.
No carnaval a plástica dos corpos vale mais que o conteúdo destes, vale mais que o pensamento, dialética e até metafísica. Tudo se resolve na mera e simples equação de alegria, folia solvida em quatro dias do ano.
Anônimas figuras que travam uma breve revolução cultural e social nas ruas, calçadas, clubes e passarelas que são liberadas para a manifestação espontânea de alegria, musicalidade e arte. Durante aqueles dias de folia se a felicidade não existe, ela é inventada.
Uma das mais antigas fantasias do carnaval é de um triângulo amoroso pierrot, arlequim e columbina todos personagens da Comédia Dell`arte surgida na Idade média européia.
Essas comédias eram espetáculos teatrais populares, sem texto fixo, e aconteciam nas ruas em pequenos palcos. Tais personagens eram sempre estereótipos exagerados. O Arlequim era o fanfarrão, esperto e trapaceiro. (bon vivant) Gostava das coisas boas da vida e se assemelhava a um bobo da corte. Já o Pierrot era o idealizador do amor, um clássico sonhador ingênuo e romântico.
Os dois eram apaixonados por Colombina, que era uma dama de companhia da corte e, que por sua vez, amava os dois por ter no amante Arlequim a realização carnal e no verdadeiro amor, Pierrot, a delicadeza, a fantasia e o sonho.
O que reforça o fato de alguns foliões buscarem ideariamente um grande amor nesses dias inebriante de alegria e, se possível unir o verdadeiro amor com seus dois vieses, o carnal e o espiritual.
Também é antiga a fantasia do clown ou clóvis ( ou bate-bola) inspirados nos palhaços fanfarrões é o terror das crianças, com sua roupa de seda (macacões) coloridos e máscaras com um orifício no lugar da boca, preenchido em geral por uma chupeta. E não se pode esquecer também da famosa bexiga amarrada a uma varinha que serve para fazer barulho e assustar a criançada.
Com o passar do tempo a indumentária do clown foi incorporando novas características como a sombrinha, o leque e que passaram a classificar os diversos tipos de clóvis. Atualmente através da Riotur se promove até concurso de grupos de clóvis.
Hoje, se tivesse que escolher uma fantasia popular, sairia de político com qualquer destas máscaras tão caricatas que são capazes de recriar e quem sabe revolucionar a realidade através da zombaria.