Erro médico

A gente volta-e-meia escuta falar em “erro médico”, como algo aterrorizante, como uma pinça esquecida na barriga do paciente, de um órgão extraído quando devia ser outro, de algum remédio indevidamente receitado ou de alguma cirurgia que resultou em sinistro. Se de um lado, há uma ocorrência diminuta de erros médicos no terreno técnico, de outro podemos detectar alguma falhas no aspecto ético. Não gosto de falar em ética, pois em muitos casos as pessoas apelam para aspectos da deontologia, a que chamam de “ética profissional”, o que muitas vezes é um mecanismo corporativo de defesa. Se for sectária ou corporativa, a ética invocada torna-se inconsistente e passível de suspeição.

Há dois aspectos que eu reputo como “erro médico” e que me deixam exasperado: a caligrafia de alguns profissionais e os atrasos no horário das consultas. Quanto à caligrafia parece que existe uma lei ou regulamento que fala na obrigatoriedade de receitas e requisições serem preenchidas em letra de forma ou alguma forma que a prescrição se torne inteligível. Tem casos que nem as farmácias conseguem decifrar o que está escrito. No passado, quando tínhamos velhos farmacêuticos atrás dos balcões, e o número de medicamentos era menor, a coisa não era tão complicada.

Hoje, considerando-se que os atendentes são jovens, não têm muita experiência e os medicamentos cresceram em variedade, não é muito fácil adivinhar o que está escrito em uma receita. Há dias li no jornal que paciente teve que esperar sentado o dia todo, numa sala de espera, pois o pessoal do hospital não conseguiu decifrar qual a cirurgia que deveria ser feita. Outra pessoa, conhecida minha, teve que voltar ao consultório pois o a clínica não sabia qual o exame fazer, tal a imprecisão das garatujas. Há quase meio-século, recordo que minha mãe dizia que deviam ensinar caligrafia aos médicos. Ora, você escrever alguma coisa num papel, sem se preocupar se as pessoas vão entender, parece um desrespeito. Alguns médicos que me atendem já aderiam ao computador. Dão dois ou três clics no mouse e já sai a receita ou a solicitação de exames. Barbada!

O outro problema, que eu reputo também como desrespeito, é o atraso no atendimento das consultas. Se for uma atividade matinal, até se justifica, pois como a maioria das cirurgias é feita nesse turno, nem sempre é possível prever o horário de término, atrasando as consultas posteriores. Mas há casos em que o profissional não é cirurgião, ou a consulta ocorre lá meio da tarde, e mesmo assim o paciente tem que amargar às vezes mais de uma hora de espera. E não se trata de SUS, mas atendimento particular ou convênio. Isto também é uma falta de respeito com as pessoas. Eu não espero mais de vinte a trinta minutos. Passou dessa tolerância eu vou embora.

A questão é que a maioria das pessoas vê nos médicos um semideus, que não pode ser contestado, pois ambas as falhas, letra ilegível e atrasos podem ser objeto de ações no Procon, como legítima busca do direito do consumidor.

Filósofo e Escritor, autor, entre outros livros, de “Bioética, a ética a serviço da vida”, Ed. Santuário, 2003.

Antônio Mesquita Galvão
Enviado por Antônio Mesquita Galvão em 04/02/2008
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