Apesar de o mundo estar cada vez mais conectado, com acesso instantânea a informações e comunicações, o isolamento das pessoas pode ser explicado por uma combinação de fatores sociais, psicológicos e culturais. A superficialidade das relações interativas, como as redes sociais, torna a interação mais fácil, mas muitas dessas conexões são superficiais. As curtidas, comentários e mensagens instantâneas não substituem a profundidade do contato humano presencial.

 

A ideia de cada um por si é reforçada por uma sociedade de consumo que incentiva o sucesso individual. Isso pode afastar as pessoas e criar barreiras psicológicas. Além disso, o excesso de informação e notificações pode causar cansaço mental. A maioria dos indivíduos prefere o isolamento para proteger a saúde mental, evitando o fluxo constante de informações.

 

Nas redes sociais, as pessoas tendem a mostrar apenas o lado bom de suas vidas, gerando uma sensação de inadequação nos outros. Isso leva ao isolamento, uma vez que as pessoas evitam revelar suas vulnerabilidades. As mensagens eletrônicas substituíram as visitas e encontros presenciais, o que diminuiu a sensação de proximidade e conexão emocional.

 

Sem perceber, a ansiedade, a depressão e outros distúrbios mentais aumentaram nos últimos anos, em parte devido às pressões sociais e ao uso excessivo de tecnologias. Isso impede que as pessoas se reúnam para evitar o contato social.

A COVID-19, além de ceifar muitas vidas, reforçou hábitos de isolamento, e muitas pessoas não retornaram ao mesmo nível de interação social de antes, como praças, clubes e outros espaços públicos, onde as pessoas não interagem significativamente.

 

A globalização e a tecnologia trouxeram inúmeras possibilidades de conexão, mas também criaram novas barreiras emocionais e sociais. A recuperação do senso de comunidade e o reconhecimento da presença real das pessoas ao nosso redor pode ser o caminho para superar esse isolamento.

 

Nos anos 1980, as interações eram predominantemente realizadas por meio de interações presenciais. Os jovens se reuniam em garagens, praças e centros culturais para tocar em conjunto, trocar ideias e criar projetos coletivos. A coletividade era o fator que impulsionava a criatividade musical, e o sonho de formar uma banda era um sonho recorrente entre os jovens. O contato físico foi substituído pelos chats, videoconferências e redes sociais, o que reduziu o sentimento de comunidade. Atualmente, os jovens seguem a lógica do "eu", superando o "nós". Enquanto muitos jovens buscam o sucesso individual, como "influenciadores" ou "artistas solos", a lógica colaborativa de grupos e bandas perde espaço.

 

A tecnologia está se tornando mais acessível para qualquer pessoa, sem a necessidade de uma banda. Nos anos 1980, era necessário reunir pessoas para ter acesso a instrumentos musicais, equipamentos de gravação e estúdios. Atualmente, com softwares de edição de áudio, artistas podem criar tudo de forma independente em suas residências.

 

As garagens, praças e centros culturais, que outrora eram locais de encontro para bandas e grupos artísticos, estão cada vez mais escassos ou controlados. A privatização dos espaços públicos afastou os jovens dos locais de convívio e colaboração criativa. Nos anos 1980, as bandas eram o centro da cena musical, com uma grande valorização de discos, shows e festivais. Atualmente, o consumo de música é dividido em playlists e serviços de streaming, que promovem artistas individuais e faixas isoladas em detrimento de álbuns completos. Isso desmotiva a ideia de se formar uma banda com uma identidade sólida. O produtor de quarto é a nova figura do músico contemporâneo. Um artista independente pode compor, produzir e lançar suas composições de forma independente, enquanto, nos anos 1980, isso requeria o esforço conjunto de uma banda. Isso abalou os laços criativos em grupo. Naquela década, movimentos culturais como punk, rock e hip-hop incentivavam a criação de coletivos e grupos musicais. A cultura jovem contemporânea é mais dispersa, menos concentrada em um movimento de geração e mais dispersa em nichos e subculturas digitais.

 

As redes sociais encorajam o "show de si mesmo" e a procura por atenção individual. Isso dificulta a criação de projetos coletivos, uma vez que cada um deseja ser o protagonista de sua própria marca pessoal. Os jovens e adultos estão cada vez mais sobrecarregados com seus estudos, trabalho e atividades paralelas. Nos anos 1980, o lazer era predominantemente comunitário, com maior tempo disponível para formar bandas e grupos de criação. O que se apresenta diante de nós é uma mudança lenta, mas implacável: o mundo anteriormente dominado pelos grupos agora orbita em torno do indivíduo. As praças lotadas, as garagens acústicas e os centros culturais vibrantes foram substituídos por quartos isolados, onde a tela fria do celular é a única janela para o mundo. A presença humana foi substituída por avatares e a troca de olhares foi substituída por uma troca de "likes".

 

A mudança não é apenas de espaço, mas também de essência. Antes, as ideias se cruzavam em conversas, as músicas eram compostas por vozes distintas que se uniam em harmonia. Cada um está escrevendo sua própria sinfonia, ajustando o ritmo de acordo com algoritmos invisíveis. O coletivo se dispersou em nichos digitais, e o conceito de comunidade tornou-se uma ilusão numérica, baseada em seguidores e não em presenças.

 

É imperativo romper com esta bolha. Não se trata apenas de uma adaptação ao "novo "novo", mas de uma perda invisível, mas crucial: a nossa humanidade compartilhada. Se não agirmos de forma crítica e consciente, poderemos nos tornar sombras uns dos outros, reflexos distantes numa parede de vidro. Precisamos resgatar o valor do encontro, e que as praças se encham de risos, que as garagens retornem a abrigar bandas desafinadas e os centros culturais escutem os passos de quem sonha junto. Dessa forma, poderemos romper com o ciclo de isolamento e recuperar a alegria de sermos novamente "nós".

Antonio Souto
Enviado por Antonio Souto em 16/12/2024
Reeditado em 16/12/2024
Código do texto: T8220637
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