O Amor para a Psicanálise ( Parte V )
Cont. da Entrevista
Entrevistadora: E a fantasia masculina?
J-A Miller: Está bem evidente no amor à primeira vista. O exemplo clássico, comentado por Lacan, e, no romance de Goethe, a súbita
paixão do jovem Werther por Charlotte, no momento em que a vê pela primeira vez,
alimentando ao numeroso grupo de crianças que a rodeiam. Há aqui a qualidade maternal da mulher que desencadeia o amor. Outro
exemplo, retirado de minha prática, é este: um patrão quinquagenário recebe candidatas a um posto de secretária. Uma jovem mulher de 20 anos se apresenta; ele lhe declara de imediato seu fogo. Pergunta-se o que o tomou, entra em análise. Lá, descobre o desencadeante: ele havia nela reencontrado os traços que evocavam o que ele próprio era
quando tinha 20 anos, quando se apresentou ao seu primeiro emprego. Ele estava, de alguma forma, caído de amores por ele
mesmo. Reencontra-se nesses dois exemplos, as duas vertentes distinguidas por Freud: Ama-se ou a pessoa que protege, aqui a
mãe, ou a uma imagem narcísica de si mesmo.
Entrevistadora: Tem-se a impressão de que somos marionetes!
J-A Miller: Não, entre tal homem e tal mulher, nada está escrito por antecipação, não há bússola, nem proporção pré-estabelecida.
Seu encontro não é programado como o do espermatozoide e do óvulo; nada a ver também com os genes. Os homens e as
mulheres falam, vivem num mundo de discurso, e isso é determinante. As modalidades do amor são ultrassensíveis à
cultura ambiente. Cada civilização se distingue pela maneira como estrutura a relação entre os sexos. Ora, acontece que no Ocidente, em nossas sociedades ao mesmo tempo liberais, mercadológicas e jurídicas, o “múltiplo” está passando a destronar o “um”. O modelo ideal do “grande amor de toda a vida” cede, pouco a pouco, terreno para o ( speed dating ), ( o speed loving ), e toda floração de cenários amorosos alternativos, sucessivos, inclusive simultâneos.
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