O Amor para a Psicanálise ( Parte IV )
Cont. da Entrevista
Entrevistadora: É difícil acreditar em um amor fundado nesses elementos sem valor, nessas
baboseiras!
J-A Miller: A realidade do inconsciente ultrapassa a ficção. A senhora não tem ideia de tudo o que está fundado, na vida humana, e
especialmente no amor, em bagatelas, em cabeças de alfinete, os “divinos detalhes”. É verdade que, sobretudo no macho, se
encontram tais causas do desejo, que são como fetiches cuja presença é indispensável para desencadear o processo amoroso. As particularidades miúdas, que relembram o pai, a mãe, o irmão, a irmã, tal personagem da infância, também têm seu papel na escolha amorosa das mulheres. Porém, a forma feminina do amor é, de preferência, mais erotômana que fetichista : elas querem ser
amadas, e o interesse, o amor que alguém lhes manifesta, ou que elas supõem no outro, é sempre uma condição ( "sine-qua-non" ) para desencadear seu amor, ou, pelo menos, seu consentimento. O fenômeno é a base da corte masculina.
Entrevistadora: O senhor atribui algum papel às fantasias?
J-A Miller: Nas mulheres, quer sejam conscientes ou inconscientes, são mais determinantes para a posição de gozo do que para a escolha amorosa. E é o inverso para os homens. Por exemplo, acontece de uma mulher só conseguir obter o gozo – o orgasmo, digamos – com a condição de se imaginar, durante o próprio ato, sendo batida, violada, ou de ser uma outra mulher, ou ainda de estar ausente, em outro lugar.