O Paciente Desajustado
Chegando ao fim desta série de artigos, sinto-me um pouco insatisfeito por não ter
podido dar uma impressão bem clara e nítida, ( longe de ser completa), do processo
da psicanálise.
Talvez só os que se dedicam a esta especialidade podem compreender as dificuldades que se opõem a quem tenta livrar a psique de suas doenças e desajustamentos.
A análise é, muitas vezes, comparada a uma operação cirúrgica na alma, mas o que precisa ser extirpado, são forças dinâmicas, às vezes
perigosas.
Portanto, o analista-cirurgião da alma deve ter boa técnica, baseada no conhecimento profundo da teoria, para bem usar seu instrumental.
Uma análise mal guiada pode prejudicar o paciente tanto quanto um bisturi na mão dum
cirurgião pouco hábil.
O instrumento do analista é, em primeiro lugar, seu próprio equilíbrio mental completo.
E, para chegar a isso, Freud e seus discípulos resolveram impor ao candidato a psicanalista o dever de fazer uma psicanálise didática, indispensável para o exercício da profissão.
Em nenhum outro ramo da medicina, o médico precisa submeter-se ao tratamento que ele pretende posteriormente aplicar a seus pacientes.
Mas o psicanalista não pode aprender a técnica analítica sem sentí-la aplicada à sua própria pessoa.
Quem nunca experimentou as emoções da transferência, sentindo amor ou ódio irracional para com o analista, ou conhecendo o processo da conscientificação de um impulso recalcado, nunca será capaz de compreender o que está acontecendo com seus pacientes.
Quanto à eficiência do tratamento psicanalítico, não há dúvida que os re-
sultados, em geral, são satisfatórios.
Mais indicados para êsse gênero de tra-
tamento são os casos de psiconeurose, histeria, neurose obsessiva e distúrbios do
caráter.
Entre os casos refratários, podemos distinguir vários grupos:
1 —•
Nas neuroses muito antigas, a análise é difícil e mais longa, malogrando às vezes.
A idade do paciente, por si só, não é fator decisivo, pois que uma pessoa idosa pode ter uma neurose recente, ao passo que uma pessoa jovem pode sofrer, desde a in-
fância, de distúrbios neuróticos graves.
2 — Papel importante desempenham as
dificuldades reais da vida do paciente.
O ambiente em que êle vive pode ser um
fator desfavorável para a eficiência da psicanálise.
Pais ou cônjuges neuróticos ou de pouca compreensão, às vezes dificultam a vida do paciente de tal modo que a neurose se torna uma proteção contra males maiores.
Em tais situações, os esforços do analista não são suficientes para contrabalançar a influência nociva do ambiente.