SERVIDOR PÚBLICO: VAMOS FALAR DE NÓS?
Para isso, é preciso certa disposição à “humildade”, uma vez que necessitamos reconhecer que nem tudo que carregamos conosco, seja virtuoso.
Há uma boa meia-dúzia de questões que jogamos para “debaixo do tapete”, na escuridão. Elas não são virtuosas, e nos incomodam muito quando vêm à luz. Ou melhor: incomodam, mas não a todos — porque, há tanto tempo as mantemos escondidas, que muitos, por conveniência, passam a considera-las incorporadas aos seus direitos de servidor. Não são incorporáveis e não são “direitos”.
Um exemplo?
Vejamos o quesito “presença” (normal). Estar o servidor em seu posto de trabalho durante todo o expediente em todos os dias úteis.
Isso significa estar a postos no horário determinado e nele permanecer integralmente (e laborando) de acordo com sua carga horária. É uma regra que só deveria e poderia ser quebrada muito eventualmente, frente a uma necessidade inadiável, premente. Mas não é o que ocorre. Por motivos insignificantes, esses servidores preenchem uma C.I. (quando preenchem), e lá vão pela cidade afora a cuidar de “seus interesses”. Ou seja: estão descumprindo uma obrigação prevista em seus contratos de trabalho.
Visto esse exemplo, é preciso reconhecer que muitos outros há, tão nocivos, debaixo do tapete. Isso, entretanto, não é coisa nova. Não começou nesta “geração de servidores”. Já vem de outras. Esta apenas deu continuidade. A consequência dessas questões não-virtuosas, que colocamos debaixo do tapete, é que elas ficariam invisíveis apenas aos nossos olhos de servidor. A Sociedade Civil as vê. Vê e fala. Fala e adjetiva. E adjetiva com adjetivos que “desqualificam”. Os adjetivos que desqualificam os servidores, desqualificam, igualmente, os empregadores dos servidores.
Agora, nos tempos presentes, algo novo aparece. Aparece e começa a nos causar certa preocupação. É uma “reforma administrativa”, que parece estar em fase de gestação no Governo Federal. A Imprensa, a Mídia — que faz parte da Sociedade Civil, e fala o que interessa e o que não interessa à própria Sociedade, já está meio que “em campanha” para que a dita reforma suprima a “estabilidade” que vigora no serviço público. E a Sociedade Civil, que adjetiva os servidores, muito provavelmente vai abraçar com ardor essa tese de supressão. Ou seja: o servidor não terá outra voz, que não a dele, que lhe seja favorável contra essa mudança. Não terá nem contra essa nem contra outras que certamente estarão no bojo da reforma que virá. E que poderão, mais diretamente, afetar-lhe negativamente os interesses.
A esta altura destes “rabiscos”, confesso que pensei em mudar-lhes o título e outras coisas que estão aí p’ra cima. Ser mais... “suave”, por assim dizer. Mas resolvi que não. É que, em meu modo de ver, em minha opinião, a categoria “servidores públicos”, há muito tempo, começou a andar muito segura de si, como se o porvir não viesse. Em razão disso, uma parcela não muito grande, mas nem por isso insignificante, abraçou essa tese furada de incorporar a seus direitos, direitos que absolutamente não tem.
De outro lado, a outra parcela de servidores — aquela que cumpre criteriosamente com suas obrigações — pode não ter notado a “apropriação” (indevida) de direitos indevidos, ou negligenciado o que acontecia (ou acontece). E não se têm notícias de que esta tenha feito algo para conter os casos de apropriação daquela. De qualquer modo, ambas não teriam se importado em cuidar de suas lavouras — lavouras que, na verdade, são uma só grande lavoura: o emprego estável no serviço público, via-de-regra, bem remunerado. E o “vento” da reforma certamente ventará sobre toda ela.
Penso que ela virá; e, vindo, talvez conte com os aplausos de tudo aquilo que, na Sociedade Civil, não seja servidor ou dependente de servidor; justamente por causa da visão pouco simpática que se deixou criar e foi-se criando em torno da figura do Servidor Público.
Às vezes, é preciso falar francamente de nós mesmos.
JOSÉ IZIDRO MANOEL