EU VIM PARA SERVIR (Mc 10, 45)

Motivação na origem da palavra é a junção de motivo e ação. Ter motivos para agir. Quando pensamos na área pública, no serviço público que tem em sua essência “o servir”, temos diferentes fontes motivacionais que levam pessoas a escolherem essa carreira ou passarem por essa experiência:

• – Estabilidade financeira;

• – Influência familiar;

• – Poder;

• – Oportunidade do momento;

• – Carreira política;

• – Vontade de transformar a comunidade ou país.

“Eu vim para servir” (Mc 10, 45) Essa frase de origem evangélica, atribuída a Jesus, expressa em síntese a função do servidor e profissional público. Independente do fator motivacional que levou e que leva pessoas a seguirem carreira ou ocuparem um cargo público, as atividades são sempre para servir a comunidade nas mais diversas necessidades de cidadão perante o estado, o poder público.

As razões ou motivações para iniciar são diversas. Mas para que haja sequência e perseverança na boa realização dos encargos da função assumida e que em seu exercício possa se extrair a razão maior de toda busca humana, a felicidade, faz-se mister a clareza de um propósito maior. Um propósito bem definido.

“O ser humano precisa de água, de comida e de sentido. Nos alimentamos de sentido”. (Luiz Felipe Pondé). O homem é o único animal que busca sentido para viver e realizar as coisas. E na busca por sentido, está buscando a felicidade que no final das contas permeia toda a nossa trajetória.

Fazemos churrasco assistindo nosso time predileto jogar porque queremos ser felizes. Estudamos buscando melhorar na profissão porque queremos ser felizes. Fotografamos o que comemos, com quem estamos, por onde vamos e o que compramos na insana busca da felicidade de uma curtida e um comentário. Buscamos alguém para um romance e um relacionamento para sermos felizes. Viajamos, buscamos amigos, buscamos Deus na direção de encontrar a felicidade. Enfim ela, a felicidade molda nossas escolhas, conscientes e inconscientes.

Dentre as diversas facetas do que nos torna felizes, que traz alegria e prazer, desejamos e nos esforçamos com genuína predileção pela carreira profissional. É o sonho da maioria dos seres humanos, e essa busca é mais latente na juventude, no período da mocidade. Quem nunca imaginou encontrar o trabalho dos sonhos, ter prazer e ganhar dinheiro, ser reconhecido e evoluir na carreira?

Mas poucos encontram o verdadeiro sentido na escolha profissional. Poucos trabalham com um propósito definido e claro para fazer o que faz. O mais comum é ter como propósito, como sentido para o trabalho o ganhar dinheiro e pagar as contas. Ganhar dinheiro e poder consumir, viajar, ter status.

Não sejamos hipócritas. Dinheiro é bom e necessário. É fruto de esforço e inteligência, é abençoado. Abre portas, traz facilidades e uma série de outras coisas. E a parte prática da vida requer isso mesmo. Devemos honrar compromissos e cumprir com responsabilidades que exigem em sua totalidade o dinheiro.

O algo mais

Em uma pesquisa realizada pelo aplicativo Survey Monkey , o resultado aponta que 36,52% dos profissionais estão infelizes com o trabalho que realizam e, 64,24% gostariam de fazer algo diferente do que fazem hoje para serem mais felizes. Foram pesquisados mais de 300 profissionais, de 21 estados brasileiros e 14 países representados tendo 18 brasileiros expatriados com faixa etária entre 26 e 60 anos de idade.

Em uma palestra para TEDx Talks, Allan Costa conta brevemente sua história profissional. De origem muito humilde viu nos estudo a oportunidade de mudar de vida. Delineou sua carreira com propósito de ganha dinheiro e aos 40 anos recebia como executivo do Sebrae um salário de mais 900 mil reais anuais. Mas infeliz pediu demissão e foi ser palestrante viver de seu propósito, o que causou espanto e incompreensão de muitos ao seu redor, principalmente de familiares.

Esse é só um exemplo de muitos que entendem a importância e o poder do propósito. “Sem propósito não existimos. O propósito nos conecta e nos motiva, orienta e faz agir. O propósito nos define e nos une.” (Agente do sistema em diálogo com Enderson, personagens do filme Matrix)

“O propósito é o senso de pertencimento a algo superior a nós mesmos, pelo qual devemos trabalhar para um futuro melhor. Isso é o que cria a verdadeira felicidade”. (Mark Zuckerberg, fundador do Facebook) De fato, os seres humanos precisam de sentido, sendo o propósito um caminho para isso. Mas propósitos são subjetivos, variando de pessoa para pessoa.

Daí a importância de que cada indivíduo descubra seu propósito e assim possa somar a uma equipe com propósitos comuns. Que no caso do serviço público é prestar um serviço específico a depender de cada departamento e setor.

O servidor que tem claro seu propósito pessoal e do grupo a qual pertence tem um comportamento diferenciado, resultados melhores e mais satisfação, prazer no que faz. Mesmo que realize tarefas que não lhe dão prazer. Mesmo que faça o que não gosta, o faz com dedicação e amor de tal maneira que os sentimentos em relação atarefam muda. E fica mais atento e aproveita melhor as oportunidades que a vida, a profissão ou a instituição oferece para alçar voos ou simplesmente encontrar melhores condições no trabalho.

O servidor, ou funcionário que tem um propósito claro e genuíno executa suas atividades sem murmúrios internos e externos. Mesmo que não esteja no ambiente ideal, com as pessoas que desejaria, na equipe dos sonhos faz seu melhor. Com celeridade, com gentileza, com empatia. O servidor ou funcionário público que tem propósito e se alimenta dele diariamente busca melhoras pelo diálogo, tem prontidão e sabedoria. Transmite paz e alegria.

A clareza do propósito faz o profissional vencer os obstáculos, superar as adversidades e as condições presentes. Faz buscar a excelência, usar melhor o cérebro a inteligência. E o que a excelência senão ultrapassar o básico. “Ser excelente é não se contentar com o ordinário, é ter a obrigação como ponto de partida e não como ponto de chegada. Faça o seu melhor na condição que você tem enquanto você não tem condições melhores de fazer melhor ainda.” (Cortella)

Quando vivemos de propósito, servir não é uma imposição, mas uma escolha e toda escolha consciente e nobre tem em si o gérmen da alegria. E uma das maiores fontes de alegria que temos está nos relacionamentos, principalmente quando temos a oportunidade de servir. Ajudar o outro é fonte genuína de alegria e paz. E ajudar não significa apenas a ajuda caritativa, é qualquer ajuda mesmo que seja no âmbito das obrigações da função. A boa vontade, a paciência e o interesse em colaborar são legítimos instrumentos do amor.

O piloto automático

Mas a clareza de um propósito genuíno vem do auto conhecimento. É preciso estar consciente de si mesmo, da própria história e de um futuro que se almeja. Sair do automático é fundamental. No automático não fazemos escolhas conscientes. Ouvir o silencia e fazer escolhas conscientes. Ter uma filosofia de vida, ter vida contemplativa, com espiritualidade e ações ligadas a valores claros.

Quando viemos no piloto automático seguimos a filosofia de Zeca Pagodinho, deixa vida me levar, vida leva eu.

Auto cuidado

Mas para servir melhor precisamos cuidar melhor de nós mesmos. Todo profissional que lida com pessoas, que cuida de pessoas precisa antes de mais nada cuidar de si mesmo. Não se atinge alta performance, performando apenas no contexto do trabalho. É preciso um cuidado integral de si mesmo, para que nos ambiente do trabalho, do lazer, social ou em qualquer outro momento possamos estar inteiros com energia física, disposição e bom humor.

E o autocuidado exige um olhar a atitudes para as dimensões físicas e mentais de nossa vida. Qual a qualidade de meus pensamentos e das informações que nutro a minha mente. Tudo o que leio, assisto e ouço influencio no meu psicológico e na minha qualidade mental que por sua vez reflete no corpo.

Como tenho cuidado do meu corpo? Com o que o alimento e como o alimento? Eu apenas como ou o nutro meu organismo. Como o hidrato? O que consumo como bebida? Nossa alimentação e hidratação tem grande peso em nossa qualidade de vida.

Esse corpo é sedentário ou ativo? Um corpo saudável é menos vulnerável a doenças fisiológicas, mas também a emoções negativas. Um corpo saudável tem uma mente melhor, uma autoestima e autoconfiança mais fortalecidos. A química do corpo interfere na mente e vice e versa.

E como são os ambientes que frequento, as pessoas com quem convivo com mais frequência? Como lido com meus desejos e sonhos? Postergo ou faço acontecer? Quando estou bem comigo, física, mental e emocionalmente, estou melhor para servir e servir com amor colhendo paz e alegria.

O Legado

Precisamos levar em conta outro fator importante. Quando amamos o que fazemos, o resultado é uma entrega muito bem feita, naturalmente. Muitas vezes, deixa-se sonhos e propósitos para trás devido às dificuldades diárias. Por exemplo, falta de apoio e oportunidades, más condições financeiras, estrutura e condições de trabalho desfavoráveis ou até preguiça de encarar um novo desafio. Mas sempre é tempo de voltar os olhos para o que dá sentido à vida e, consequentemente, ao trabalho.

A proposta aqui é pensar no legado que deixaremos, se o deixarmos. Legado não tem a ver com grandeza, mas a possibilidade de todos os dias fazer a diferença na vida de alguém. No trato com o outro, colega ou público, demonstrar interesse em resolver o problema, usar de cortesia e polidez, ter celeridade e eficiência, sabedoria, amor na prática. Quando me refiro amor, fazer com amor não tem a ver com nutrir bons sentimentos mais fazer bem feito o que se faz ou deve ser feito. Não é com mágica que se faz um bom trabalh. Mas com bom trabalho que se faz mágica. (Lee Cockerell) Legado é fazer a diferença na vida das pessoas.

Que possamos passar a vida sendo excelentes. Seguindo um convite que nos faz Jesus, busquemos com coragem e desejo sermos perfeitos como o Pai do céu é perfeito. Que seremos, muito bem sabemos que não, mas ao mirar essa perfeição atingiremos o melhor de nós, o mais próximo de Deus.

"A mais honrosa das ocupações é servir o público e ser útil ao maior número de pessoas." Michel de Montaigne