TRISTEZAS NECESSÁRIAS

A tristeza em si mesma não é uma coisa ou sentimento ruim. Triste, mas triste mesmo, são as tristezas desnecessárias. Tristezas inúteis, fúteis, narcisistas, supérfluas, descabidas, impróprias, inoportunas, prescindíveis e despropositadas.

Porém, a tristeza, a tristeza mesma, é bem-vinda e necessária, embora na hora incomode, amargue, descontente e doa. Mas tristeza é um afeto básico, primário e fundamental.

Em nossa natureza inata temos as seguintes emoções primárias: medo, raiva, alegria e tristeza. Todos entendemos a importância do medo à nossa sobrevivência, assim como igualmente a raiva/agressividade. Todos celebram e anseiam a alegria, o júbilo, o contentamento e a felicidade. Todavia, quando se trata da tristeza ninguém a quer sentir, e quando a sente quer logo dela se livrar. Por quê? Por que a tristeza é tão desprestigiada?

Todos os afetos, desejáveis e/ou indesejáveis, são reações do organismo frente ao mundo. Todos somos afetados pela vida. Inclusive os ratos, as baratas, os polvos e caranguejos sentem algo. Segundo Jack Schultz, professor da Divisão de Ciências Vegetais da Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, com mais de quarenta anos pesquisando a vida dos vegetais e dos insetos, até as plantas têm lá seus sentimentos.

A tristeza, como qualquer afeto, é uma resposta ao que nos está acontecendo. Segundo Spinoza a tristeza é uma afecção (afeto) que nos remete a uma diminuição da potência de ação, quando nossa capacidade de esforço inicialmente enfraquece. Sob tal perspectiva a tristeza parece ser somente negativa. Não é o caso em muitos casos. Vejamos...

Aristóteles considerou o afeto melancólico não patológico como uma espécie de mal necessário, isto é, como imprescindível à inspiração artística, poética e filosófica. Exageros à parte, a tristeza é denotativa da sensibilidade da alma, um sentimento que nos predispõe à introspeção e à contemplação não beatificada da vida. A tristeza nos possibilita refletir e aprofundar o refletido. Talvez porque quanto se está saudavelmente triste o tempo parece mais lentificado e muitos detalhes podem ser assim mais nitidamente observados.

O neurocientista luso-brasileiro Fabiano de Abreu, por exemplo, destaca que a tristeza, quando não profunda ou psicopatológica, pode contribuir significativamente ao processo criativo. Alega que tal sentimento abre espaço psíquico a ser mais receptivo aos estímulos, possibilitando ainda o aprofundamento da nossa vida afetiva de maneira mais imaginativa, sagaz e fecunda.

Claro que estamos a falar da tristeza normal, aquela que não afeta nossa produtividade. Trata-se de um sentimento reativo e útil, que geralmente é passageiro. Mesmo a tristeza mais prolongada, como aquela associada ao luto, por exemplo, não pode e não deve ser considerada depressão, esta sim uma tristeza de cunho patológico e que nos afeta em várias esferas da funcionalidade pessoal.

Certa vez escrevi: “agradeço aos dias tristes esta minha consciência dos dias alegres e felizes”. Sim, pois sem momentos de tristezas como saberíamos identificar, portanto, os momentos alegres e felizes? Todo ponto para ser visto precisa de seu contraponto. Ou como disse o Nobel de Literatura Gunter Grass, “na tristeza flutua o riso”.

Alegria e tristeza são sentimentos coirmãos, dois lados de uma mesma moeda. Ambos são naturais, indispensáveis e essenciais. Perfeito seria se conseguíssemos o que sugeriu o filósofo e teólogo cristão do século XVI Giordano Bruno, que é ser “feliz na tristeza, triste na alegria”.

Coitado do humano que só quer ser alegre e feliz o tempo todo. Ele será um constante frustrado, fracassado e desapontado. Um ser humano assim tão iludido, ingênuo e decepcionado, só pode acabar sendo um homem infelicitado e triste.

Um dia haverei de ter

o melhor dia da minha vida

Já tive bons dias

dias melhores

dias alegres

dias felizes

mas nunca tive até aqui

o melhor dia da minha vida

Nunca o melhor dia da vida

deve ser o dia já vivido

o dia decorrido, passado

realizado e acontecido

O melhor dia da vida

encontra-se sempre

no amanhã do tempo

da primavera ao outono

em algum dia a ser ocorrido

pois o melhor dia da minha vida

é um dia até agora não transitado

findo, vencido ou existido

O melhor dia da minha vida

é amanhã, depois de amanhã,

logo a seguir do que vem do porvir

já que ele é sempre um dia vindouro

que espero encontrar quando for

após este meu hoje experimentado dia

O melhor dia da minha vida

está onde ainda então não estou

porque o melhor dia da vida,

o dia melhor da minha vida,

é para lá que eu sempre vou

E quando terminar esse dia

o melhor dia da minha vida

posso abaixar a cortina e fechar a porta

já que não terei, nenhuma vez mais,

um dia tão bom e perfeito

como foi o que ainda será

o melhor dia da minha vida

Joaquim Cesário de Mello

Joaquim Cesário de Mello
Enviado por Joaquim Cesário de Mello em 19/11/2022
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