SEQUESTRO E RESGATE

Tudo o que poderia parecer estranho acontecia surpreendentemente de forma normal naquele tropical país. Em nome da defesa da pátria, literalmente haviam sequestrado as cores da bandeira nacional, apropriaram-se do direito ao uso do verde/amarelo, e incentivados pelo tal Mito e seu séquito tresloucado, desenfrearam a cometer barbaridades sem a mínima noção de bom senso e por vezes, do ridículo!

 

Cobertos com as cores da bandeira e inflamados por fanáticos radicais, de forma inconsequente foram para as ruas, travaram estradas, e montaram acampamento na porta dos quarteis do comando do exercito para pedir “intervenção militar”, sendo que em algumas faixas tremulando ao vento da inconsequência podia-se ler “intervenção federal, eu autorizo”.

 

Sequer se deram ao trabalho de ler o Art.142 da Carta Magna, pois se o tivessem feito saberiam de cor e salteado as atribuições das Forças Armadas que tem seu se alicerce na hierarquia e na disciplina; defender a pátria, garantir os poderes constituídos, e garantir a lei e a ordem.

 

O presidente indiscutivelmente era o chefe do poder executivo, no entanto a Constituição Federal não autorizava as Forças Armadas a arbitrarem conflitos entre Poderes. A verdade é que a interpretação de que as Forças Armadas teriam o poder de se sobrepor a “decisões de representantes eleitos pelo povo ou de quaisquer autoridades constitucionais a pretexto de ‘restaurar a ordem’" caracterizava uma verdadeira fraude ao texto constitucional. Mas para os fanáticos de plantão palavras eram apenas palavras, e deviam ser interpretadas da forma que lhes fosse mais conveniente.

 

E assim, eles tentavam talvez relembrar os caras pintadas, movimento estudantil que tinha em 1992 o objetivo principal de derrubar o então presidente Caçador de Marajás a diferença crucial é que esses agora pediam a intervenção do exercito para eternizar o Mito no poder. O foco era desestabilizar as instituições atacando o STF e o TSE sob acusações não provadas, de fraude nas eleições que democraticamente apontara a vitória do candidato da oposição, que ainda.nem sequer havia tomado posse.

 

E lá foram eles protagonizar cenas ridículas e pagar mico, acreditavam em absolutamente tudo o que era veiculado nas redes sociais, marcharam, rezaram, brigaram, e os mais exaltados adeptos da granada, porrada, e bomba, eram réplicas perfeitas de seu ídolo de pano, ou seu santo de barro!

 

No Distrito Federal, no entanto, para surpresa dos celerados o Comando Militar do Planalto (CMP) oficiou a Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP/DF) e solicitou providências para assegurar a circulação nas adjacências do quartel, e para impedir que os manifestantes instalassem seus bloqueios.

 

Mas havia ainda uma minoria dos autointitulados patriotas, que protagonizavam cenas patéticas e impossíveis de serem ignoradas e entrariam para a história no capítulo sobre absurdos, uma delas mostrava dezenas de fanáticos ajoelhados rezando e chorando e falando às paredes do muro do quartel general do exercito, que fazendo lembrar o Muro das Lamentações.

 

Aos poucos as manifestações iam se desmantelando e a outra metade, aquela que havia votado contra o salvador da pátria que tinha perdido o jogo democrático, e talvez até mesmo uma boa parte dos torcedores do Mito, tinham outra grande preocupação, em breve haveria outro jogo.

 

Era ano de Copa do Mundo e os torcedores gostam mais de futebol do que de política e queriam o resgate da magia de torcer e até mesmo sofrer, vestindo as cores da seleção e agitando a bandeira que havia sido política e desavergonhadamente sequestrada.

#acdepaulaescritor