UMA ESTÉTICA A SERVIÇO DO MAL
 
Os setenta anos do inicio da II Guerra Mundial(1939-1945) nos faz lembrar do Nacional-Socialismo ou nazismo com sua política expansionista que arrastou a Europa e o mundo a um dos conflitos mais sangrentos da humanidade. Paralelo a guerra a lubrificada máquina de exterminio sob o dominio das SS Shutz Staffel promovia a politica de eliminação fisica dos judeus, ciganos e outros grupos vuneráveis. A propaganda nazista era o pilar da Nova Ordem Hitleriana e o cinema foi usado para veicular a ideologia nazista. O filme Triunph des Villens(O Triunfo da Vontade, Alemanha,1934) da cineasta alemã Leni Rienfensthal, ainda hoje continua sendo uma das peças de propagandas mais contudentes feitas por um regime. " É um documentário histórico, um filme verdade, não de propaganda", defende-se a autora da acusação de principal cineasta do Terceiro Reich(1933-1945), em sua autobiografia a Peneira do Tempo(1987). O filme, obedece a uma montagem primorosamente selecionada, é uma aula das mais contudentes que o cinema já produziu.
O filme faz a cobertura anual do Partido Nacional Socialista, realizado na cidade de Nurenberg, em setembro de 1934. Vale lembrar que este é um ano decisivo para Hitler, que é aclamado chanceler em 1933, consolida seu poder dentro do partido nazista, com o putsh de junho, na fatidica Noite dos Longos Punhais, episódio reconstituído primorosamente pelas lentes de Luccino Viscontti em Os Deuses Malditos(Itália,1969).
É Neste momento de apogeu que Adolf Hitler utiliza-se dos dotes artísticos de Leni Rienfensthal, atriz que se consagrou na década de 20, interpretando filmes ambientados em paisagens bucólicas com forte mística camponesa. Antes de filmar Triunfo da Vontade ela já havia estreado como documentarista do partido Nacional Socialista no congresso aterior em 1933, com o média metragem Der Sieg des Glaubens ( A Vitória da Fé ), exibido em toda a Alemanha por intermédio do Ministério da Propaganda, comandado por Joseph Gobbels. Em 1936 foi consagrada como a mais talentosa propagandista do nazismo ao filmar Olímpia, um primoroso documentário sobre as Olimpíadas de Berlim em 1935.
Para a realização do Triunfo da Vontade a diretora contou com uma equipe de produção composta por 140 auxiliares, entre cinegrafistas e técnicos diversos, além de passarelas especiais para mais de trinta câmeras dispostas em ângulos variados, além de dirigíveis. Anos após a realização do filme a cineasta declarava: " ... os preparativos para o Congresso foram realizados simultaneamente com a produção do filme, ou seja o evento foi organizado de forma espetacular, não somente do ponto de vista de uma reunião popular, mas de modo a oferecer material para um filme de propaganda...tudo foi determinado em função da câmera"
A sequência inicial de abertura é uma tomada espetacular das nuvens de Nuremberg, sugerindo altura, magnanimidade, em seguida avista-se Nuremberg , seus castelos medievais, igrejas e monumentos seculares. As câmaras aéreas captam o avião de Hitler, a sobrevoar a cidade " abençoando-a " com a sua sombra.
Nuremberg a Hollywood dos nazistas, está a postos: rostos de SA e SS a postos, a esperar a descida triunfal do "fuher" (chefe em alemão). Como figurantes desse superprodução estão os habitantes da cidade, convocados a comparecer em massa ao evento. O desembarque da comitiva nazista que inclui Gobbells, Himmler, Goring, e outros chefões do partido, é acompanhada pelo frenesi coletivo, onde a cineasta abusa do som direto. Numa sequência o fuher lidera o cortejo, de sua mercedes negra, a saudar ao modo nazista o público, em meio aos "sig heil e "heil Hitler". Segue-se close de crianças louras enfileiradas a sorrir, uma mulher do povo com uma criaça nos braços a oferecer flores ao fuher. Os planos panorâmicos são acompanhadas da música majestosa de Wagner, todo movimento de câmara conflui para a sugestão, convencimento, levando o espectador a "aderir" psicologicamete ao que é visto. Noutro plano as câmaras captam a grandiosidade da apresentação das tropas SA ao fuher, o locutor anuncia " a tropa joven do Reich" segue-se um apresentar armas( com pás), assustador, em seguida a tropa faz a declaração de fidelidade a Hitler em coro: "um Reich, um povo, um chefe."
Na abertura do congresso os pronunciamentos, destaca-se o discurso de Joseph Gobbells antevendo o tratamento que o nazismo dispensará a propaganda: " ... que jamais a chama brilhante do entusismo se apague, essa chama de luz e calor(...) à criatividade política da propaganda. Esta arte se levanta das profundezas da nação(...) na busca de suas raízes e para encontrar o seu poder(...) retorna de novo às profundezas. Pode ser que o poder baseado nas armas dê certo, entretanto é melhor e mais gratificante vencer o coração da nação e mantê-lo."
O Trunfo da Vontade é um documento revelador de um dos períodos mais delicados do século XX. Alé do seu valor como fonte histórica,ainda hoje enseja polêmicas acerca do papel da publicidade e da propaganda nas sociedades de massas. Até que ponto somos dominados pelas imagens? há limites para a manipulação de conciências?

( publicado originalmente no Caderno de Sergipe, secção vídeo, junho de 1997)
Labareda
Enviado por Labareda em 28/11/2007
Reeditado em 20/02/2016
Código do texto: T756709
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